Qual o melhor caminho?
“O macaco ficou
maluco de espreitar por trás do espelho.”
in “O Último Voo do Flamingo”
É vulgar pararmos
num cruzamento,
dirigirmos-nos a um grupo de indivíduos que aí se encontre,
colocando-lhes a sacramental questão: “Podem
informar-me, por favor, qual o melhor caminho para…”. A pergunta aparentemente inócua perturba o grupo, dado que coloca cada uma das personagens a pensar por si, na base dos seus conhecimentos e experiências,
obrigando-as ao mesmo tempo a expor a sua opinião à
apreciação do próprio grupo,
sujeitando-se às criticas que aceleram a discussão.
Comummente, é certo e sabido que, dada a divergência de opiniões que surgem em catadupa, acabamos
por nos safar com muitos
agradecimentos e procurar o caminho com mais ou menos dificuldade, tendo em conta algumas deixas captadas na
discussão que, normalmente, continua
provocando roturas e consensos.
Consciente da
perturbação que iria causar, arrisquei em colocar junto de um daqueles grupos em que uns jogam
às cartas e outros dão palpites: “Qual será o melhor caminho para a felicidade?”
Um dos componentes do grupo, com os seus setenta anos bem contados, pala do boné descaída sobre a testa e ensebada pelo uso, e mãos deformadas pelo esforço, olhou-me friamente e desdenhoso
perguntou-me: “O que é isso?”.
Outro dos presentes, olhos no chão como quem procura encontrar não sabe bem o quê, respondeu como se falasse para si próprio: “Passei por lá, mas já não sou capaz de lhe dizer onde fica, para lhe ser franco nem sei se de
facto lá estive ou se sonhei lá ter estado, o que nos parece ser bom passa tão
rapidamente…”
Foi então que se acendeu
a discussão no grupo, tendo-me
sido colocada uma pergunta pertinente: “Tem pressa ou prefere um caminho seguro?”.
Não fui capaz de responder, nem nenhum deles
esperava qualquer resposta porque, de imediato,
continuaram: “Se for pela auto-estrada a viajem é
monótona, cara e perigosa; ultrapassa ou é
ultrapassado, ninguém respeita os limites de velocidade e com frequência
somos obrigados a parar, devido a acidentes graves.
Conheço um trajecto que tem muitos desvios, não é
reconhecido nos GPS e sem guia perde-se de
certeza, além do mais, o caminho é pedregoso e a progressão é lenta. É dificultoso mas é bonito, acrescentou
um sujeito de voz aflautada; as pessoas são acolhedoras
e, à medida que alguém as conhece,
confunde-se com o seu destino que será também o seu porque percorrido por si.
Um dos jogadores, até então aparentemente alheio à discussão, lançou a última carta sobre a mesa com a energia com que habitualmente se lança o trunfo vencedor,
recolheu todas as cartas, levantou o olhar para mim, estudando
o tipo que tinha à sua frente, e dirigindo-se-me
quase piedosamente: “O que você procura não existe,
faz-se e é nesse fazer que se encontra o que procura; a felicidade está no caminho e na procura, no empenho e na alegria que pomos no que fazemos para o bem comum, lutando por uma sociedade justa, e porque nós somos o que fazemos e como fazemos, a alegria e o bem-estar reflectem-se
em nós; eu fui feliz toda a minha vida porque pensei sempre mais nos outros do que em mim e porque com os outros me preocupava sempre, também eles se
preocuparam comigo. Não há caminho para a felicidade; a felicidade estará no caminho que trilharmos.
Reuniu as cartas que mansamente foi
baralhando ao mesmo tempo que, com doçura, falava como se
reflectisse: a vida é isto, qualquer destas cartas só tem valor dentro deste baralho, o próprio rei ou o ás nada valem se lhes faltarem as
cartas tidas como de menos valor.
Não há destino, há caminho!...
Uma fábula...fabulosa! Onde nem falta uma boa lição final.
ResponderEliminarDe facto, são todas as cartas que fazem um baralho. E quem assim não pensa e julga poder jogar com um baralho incompleto, jogando somente com os "azes", com os "reis", "damas" e "valetes", tarde ou cedo fica a jogar sózinho - ou pior, fica a jogar muito mal acompanhado - e tudo perde!...
Abraço.
Vamos fazer o caminho,cantando,de braço dado com quem quer acompanhar-nos.
ResponderEliminarUm abraço,
mário
ResponderEliminarCerto,O caminho faz-se com todos os companheiros,rumo ä felecidade.
... que se faz ao andar!
ResponderEliminarNão é como dizia o António Machado?
Um abraço, hoje, amanhã e depois!