A
O nazissionismo continua
VÃO-SE EMBORA
e vão-se
Passageiros entre palavras fugazes :
carreguem os vossos nomes e vão-se embora ,
Cancelem as vossas horas do nosso tempo e vão-se embora ,
Levem o que quiserem do azul do mar
E da areia da memória ,
Tirem todas as fotos que vos apetecer para saberem
O que nunca saberão:
Como as pedras da nossa terra
Constroem o tecto do céu .
Passageiros entre palavras fugazes :
Vocês têm espadas , nós o sangue ,
Têm o aço e o fogo , nós a carne ,
Têm outro tanque , nós as pedras ,
Têm gases lacrimogéneos, nós a chuva ,
Mas o céu e o ar
São os mesmos para todos .
Levem uma porção do nosso sangue e vão-se embora ,
Entrem na festa , jantem e dancem…
Depois vão-se embora
Para nós cuidarmos das rosas dos mártires
E vivermos como queremos.
Passageiros entre palavras fugazes :
Como poeira amarga , passem por onde quiserem, mas
Não passem entre nós como insectos voadores
Porque temos guardada a colheita da nossa terra .
Temos trigo que semeámos e regámos com o orvalho dos nossos corpos
E temos aqui o que não vos agrada :
Pedras e pudor .
Se quiserem, levem o passado ao mercado de antiguidades
E devolvam o esqueleto à poupa
Numa travessa de porcelana .
Temos o que não vos agrada : o futuro
E o que semeamos na nossa terra .
Passageiros entre palavras fugazes :
Amontoem as vossas fantasias numa sepultura abandonada
e vão-se embora ,
Devolvam os ponteiros do tempo à lei do bezerro de ouro
Ou ao horário musical do revólver
Porque aqui temos o que não vos agrada . Vão-se embora .
E temos o que não vos pertence :
Uma pátria e um povo exangue ,
Um país útil para o olvido e para a memória .
Passageiros entre palavras fugazes :
É hora de vocês se irem embora .
Fiquem onde quiserem, mas não entre nós .
É hora de se irem embora
Para morrerem onde quiserem, mas não entre nós
Porque nós temos trabalho na nossa terra
E aqui temos o passado ,
A voz inicial da vida ,
E temos o presente e o futuro ,
Aqui temos esta vida e a outra .
Vão-se embora da nossa terra ,
Da nossa terra , do nosso mar ,
Do nosso trigo , do nosso sal , das nossas feridas ,
De tudo … vão-se embora
Das recordações da memória ,
Passageiros entre palavras fugazes .
Mahmud Darwish
2 comentários:
Uma boa semana com Mahmud Darwish.
Lindo poema. Cheio de dor e resitência.
Um abraço.
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