(Artigo amplamente documentado)
Histeria
A histérica campanha em torno da libertação de Alepo é elucidativa. Longe de
celebrar o fim de quatro anos de guerra nessa grande cidade síria, os meios de
comunicação, governos e parlamentos das potências imperialistas ficaram
histéricos com a derrota daqueles a quem o ex-chefe das tropas da NATO na
guerra contra a Jugoslávia, general Wesley Clark, chamou (literalmente) «os
jihadistas 'bons' financiados pelos nossos aliados» (USA Today,
11.2.16). Os 'jihadistas bons' de Wesley Clark são aqueles que decapitam
crianças, ao mesmo tempo que recebem apoio militar dos EUA (BBC, 21.7.16). São
os que comem as entranhas de soldados sírios que acabaram de matar, naquilo que
a BBC apelidou de 'canibalismo ritual' (BBC, 5.7.13), e são depois
entrevistados pela comunicação social inglesa para se «explicarem» (Telegraph,
19.5.13). São os que diariamente bombardeavam com morteiros alvos civis na
Alepo não ocupada e chacinam a comunidade cristã síria (como relata a
missionária católica argentina Ma. Guadalupe, que viveu estes quatro anos em
Alepo; observador.pt, 25.2.16). São os mercenários cujos salários são pagos
pelas petro-ditaduras do Golfo (ABC News ou Times of Israel,
1.4.12), conhecidas e intransigentes defensoras da democracia e dos direitos
dos povos... E pelo Pentágono (NY Times, 18.9.14 ou Reuters,
22.6.15).
O sofrimento do povo de Alepo foi real. Nos dois lados da cidade, e não
apenas a Leste. Foi-o, porque o imperialismo (dos EUA e da UE) optou desde o
início pela militarização dos protestos de 2011, armando e financiando bandos
terroristas para efectuar a 'mudança de regime' tantas vezes exigida
publicamente pelos Obama/Clinton, Hollande, Cameron e companhia. A guerra na
Síria não é 'civil'. É uma guerra de agressão externa, que visa destruir e
fragmentar o país, para melhor controlar os enormes recursos da região.
Nada disto é novo. Em 1957 «Harold MacMillan [PM inglês] e o presidente
[dos EUA] Dwight Eisenhower aprovaram um plano [dos seus serviços secretos]
CIA-MI6 para encenar falsos incidentes, como pretexto para uma invasão da Síria
pelos seus vizinhos pró-ocidentais», conforme documentos oficiais
descobertos em 2003 (Guardian, 27.9.03). Até a linguagem parece actual: «O plano prevê a criação dum 'Comité da
Síria Livre' e o armamento de 'facções políticas com capacidades paramilitares [...]' dentro da Síria. A CIA e o MI6 instigariam
levantamentos internos». O imperialismo nunca aceitou de bom grado a
libertação dos povos. Em Maio de 1945, no preciso mês em que terminava a II
Guerra Mundial, «tropas francesas ocuparam o edifício do Parlamento sírio em
Damasco, no qual entraram após rebentar com o portão a tiros de artilharia, de
acordo com o correspondentes da British United Press. […] aviões franceses
deixaram cair várias bombas sobre Damasco e tropas francesas metralharam várias
ruas [da cidade]» (Sydney Morning Herald, 31.5.45). Tudo isto para
impedir que, após 400 anos de dominação turco-otomana e um quarto de século de
colonização francesa, o povo sírio alcançasse a sua independência. Tudo isto,
poucos meses após a libertação de Paris da ocupação alemã.
A histeria é grande, porque a derrota do imperialismo em Alepo é pesada. O Embaixador sírio na ONU diz que agentes dos serviços
secretos dos EUA, Israel, Arábia Saudita, Catar, Turquia, Marrocos e Jordânia
estão cercados em Alepo. A histeria é também porque os dirigentes
imperialistas sabem que, cada vez mais, estão a perder o controlo ideológico
sobre os povos. Como ainda há poucos dias ficou patente na sua derrota (mais
uma) no referendo que visava alterar a Constituição italiana. O que torna
legítima a pergunta: o que fazem o BE e outras forças que se proclamam de
esquerda, levando água ao moinho das campanhas propagandísticas que tentam
'legitimar' as guerras imperialistas? Já foi assim aquando da guerra à Líbia.
Não aprendem? Ou não querem aprender?
Jorge Cadima
2 comentários:
Nem o Natal é civil! Um bom Natal, civil, civilizado mas nem por isso sem palavras-armas!
Ah palavras para que vos quero?!
E dito isto me calo, fico sem palavras!
Um bom Natal e não te esqueças dos leitões.
A merecer divulgação qp (quanto possível)!
Uma boa noite...
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