segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Todas as “Lindas” são “Tontas”?

‘As mulheres mais bonitas são as que lutam!’
Todas as “Lindas” são “Tontas”?
Semiótica de certa inteligência monstruosa na ética e na lógica do mercado. 
Máscaras da “beleza” burguesa. Como se fosse pouca a avalanche repressora que a ideologia da classe dominante descarregou, historicamente, contra as mulheres, chegou o capitalismo com a sua criatividade e rapidamente as converteu em massa explorada com caráter decorativo e estigma de “cabeça oca”. A burguesia levou séculos a confiar o voto político às mulheres, por exemplo. "No comportamento perante a mulher, despojo e escrava da voluptuosidade comum, manifesta-se a infinita degradação na qual o homem existe para si mesmo... Do carácter desta relação depreende-se até que ponto o homem se tornou e se concebe como ser genérico: a relação entre homem e mulher é a mais natural das relações entre os dois géneros do ser humano". Marx  (traduzido do castelhano)
Convertidas em seres supérfluos, servis e dóceis, as mulheres do ideal burguês deverão assumir, além do mais, um mandato mercantil útil para reforçar o consumismo. Foram habilitadas culturalmente para fazer as compras de pequenas coisas. Nunca o “caro”, nunca o “eletrodoméstico” de “alta gama”, nunca as coisas que o homem compra. Os publicistas sabem bastante dessas trapaças ideológicas. Essa “capacidade” de compra estabelece o grau de êxito que as mulheres devem conquistar no torneio burguês do êxito social, a aceitação e a admiração de outras mulheres. Especialmente para a burguesia, a mulher (que se torna, também, propriedade privada) depende – sua ontologia – da quantidade de dinheiro que o marido lhe dá para gastar nas coisas “do dia-a-dia” e na roupa que veste para decorar bem a sua personagem. Chamam-lhes “senhoras”.
Mas há um reduto ideológico (de falsa consciência) no qual se produzem e reproduzem as patologias mais humilhantes do capitalismo. É um reduto histriónico no qual as mulheres se vêem obrigadas a ser “tontas” rendíveis. Isso vê-se na “tele” nos “diários”… em todos os media e em todos os horários. É o reino do individualismo e da veneração do mercado que procura nas mulheres “lindas” a sua presa predileta porque, segundo reza a moral mercenária da publicidade, “o lindo vende”. A isso se deve a profusão histérica de estereótipos que a burguesia impõe às mulheres para as aprisionar numa prisão ideológica invisível aramada com anti valores de mercado e condutas convincentes para pôr a salvo as instituições da família, as igrejas e o estado burguês - O fetichismo da beleza feminina e o seu valor de mercado: vestidas ou nuas.
Trata-se de um reduto ideológico no qual se amassam convicções e condutas que, para cúmulo, conta com a cumplicidade de algumas mulheres e muitos homens. As mais colonizadas procuram a fama na farândola mediática burguesa. Com ou sem êxito, nas artes do exibicionismo das “lindas”, os princípios do mercado predominam, para além do imaginável, na própria vida diária, inclusive no quarto de banho onde entram centenas de produtos “indispensáveis” para manter o modelo de “beleza” ordenado pelos “media”. Trata-se de uma “tontice” imposta que envolve grande astúcia mercenária e uma moral de vendedor que, para se vender a si mesmo, conta com muitos clichés e muito pouco tempo. A “lindura” de mercado dura pouco porque a velocidade do consumismo é uma máquina produtora de desejos humanos infindáveis.
As “lindas” “tontas” são esse cliché que tem tido êxitos mercantis retumbantes. Dizem alguns que é uma forma de “sex appel” que condimenta magnificamente a imposição dos valores burgueses e todas essas aplicações, decadentes e humilhantes, que cada um de nós vê nas ruas na aparência mais cruel que a realidade impõe. Há pessoas que passam a vida inteira sem se aperceberem do papel que lhes é imposto por um sistema económico enfermo, também, como “mercadorias humanas”. Do seu disfarce, aquelas mulheres que representam (com vontade ou sem ela) o papel de “tontas” “lindas” vão medindo com uma vara burguesa a quantidade e a qualidade as suas vitórias sedutoras mais rendíveis. Poderá haver por detrás da aparência de “tontas”, inteligências mercenárias muito brilhantes escondidas entre os traços efémeros da sua “lindura”. Garantidas as regras do negócio, algumas contentam-se com a “fama”, outras aspiram a ser “divas”, pensando que se pode ser “bela”, “tonta” e, além do mais, “madura”. “Velha” é um termo que a burguesia usa quase exclusivamente para as mulheres proletárias.
Por tudo isso é que as lutas de género (que são realmente de classe) no mundo apresentam, com graus diversos, um caráter revolucionário fundamental. É especialmente com essas lutas, não exclusivas de mulheres, que se destrói sistemática e profundamente a ideologia da classe dominante e todas as suas ratoeiras opressoras por mais subtis ou sedutoras que se apresentem. A pesar disso, não contamos ainda com uma corrente crítica internacionalista capaz de gerar repúdios contundentes contra o modelo de humilhação com que a burguesia submete não poucos milhões de mulheres. Em todo o mundo e em pleno século XXI. É necessário sermos conscientes, sensíveis, solidários e proativos nas lutas emancipadoras que não são só de “género” porque são fundamentalmente de classe. É necessário desenvolver uma praxis revolucionária que censure e combata todo o modelo de opressão por mais “lindo” que pareça e abraçando sempre – com força amorosa e força científica – todas as vítimas. Ainda que o “lindo” e o “tonto” façam pensar a essas vítimas serem intocáveis, reverenciáveis ou superiores.
Uma longa lista de lutas, lutadoras e lutadores sociais enriquece a perspetiva revolucionária que nos aproxima de um mundo liberto, por fim, do capitalismo e de toda a parafernália grotesca que nos tem imposto, também, com as suas mercadorias humanas e ideológicas. Nessa longa lista de frentes da luta que se desenvolve, de maneira desigual e combinada, há um reportório de críticas que se impulsiona cientificamente porque aprendeu a não ser vítima das chantagens morais, éticas ou estéticas que a ideologia burguesa exerce fundamentalmente, para nos imobilizar e dominar. Um dia virá em que os povos deixarão de ser vulneráveis à guerra psicológica que usa “o lindo” e o “tonto” (entre milhares de subterfúgios) como estratégias de amolecimento, como ratoeiras para gerar solidariedades que, tarde ou cedo, operarão contras as vítimas. Nada mais anticristão. Um dia aprenderemos a deixar de ser usados pela lógica do mercado ainda que se apresente em “roupas interiores” com gestos sugestivos ou com “formosa” “tontice” imposta, dessa tanta sucata que ajudou a vender num mundo afogado com mercadorias que procuram milhões de compradores compulsivos.
Por Fernando Buen Abad Domínguez
(Trad. CS/LA)

1 comentário:

Olinda disse...

Verdades,sem dúvida!O perigo para o capitalismo será quando a mulher disser que o sexo é uma categoria política,deixando de ser mulher em si,para se converter em mulher para si,como dizia Rique Dalton.Abraço