sexta-feira, 3 de julho de 2020

A Mentira que Perturba - Por Fernando Buen Abad Domínguez



A Mentira que Perturba

Desaparecimento forçado da verdade: As “Fake News” são um “crime de lesa humanidade”.

Por Fernando Buen Abad Domínguez 

Ainda que alguns se esmerem em reduzir a “pandemia” de falsidades (“Fake News”) somente ao campo dos especialistas no “comunicacional”, para que pontifiquem diagnósticos e prognósticos, a dimensão do problema atingiu latitudes de gravidade incomum. Estão a tornar-nos dependentes do falso? Ser informado é um direito transversal a múltiplos direitos e responsabilidades. Inclui a educação, a democracia, a justiça... a política. A informação e a sua relação com a verdade não podem ser marionetas do circo mercantil mediático, servil à manipulação ideológica de alguns governos e empresários oligarcas. É inaceitável! Olhe-se de onde se olhar, cada caso de falácias constitui uma agressão à realidade, aos seus protagonistas e à história dos povos, ao modo de conhecer e ao modo de enunciar a realidade. Nem mais.

A chave está na práxis. Verdades ou mentiras não devem apresentar-se como “opções” aprimoradas que se oferecem no “menu” cotidiano das conveniências manipuladoras. Isso é uma obscenidade, ainda que a moralidade burguesa tenha, para si, um amplo repertório de justificações quando nos mente.

 “O pode atribuir-se ao pensamento humano uma verdade, não é um problema teórico, mas um problema prático. É na prática que o homem tem que demonstrar a verdade, isto é, a realidade e o poder, a terrenalidade do seu pensamento. O litígio sobre a realidade ou irrealidade de um pensamento que se isola da prática, é um problema puramente escolástico ”. Marx.

Nas “Fake News”, estabelece-se claramente uma fratura que corrompe o caráter objetivo e social de uma verdade. Os comerciantes das falsidades passam horas engendrando que estratégia de desvio cognitivo é mais funcional para os seus interesses, sem ter que confrontar as suas “Fake” com a prova dos factos. Isso faz do “consumidor” de falácias um glutão disfuncional e sofisticado de embustes. Entretanto, a produção de mentiras gera relações de produção que, para se suster, necessita de extinguir a verdade objetiva. Coloca os grupos sociais como burros à nora - como se fosse seu destino – para motorizar o conhecimento do falso. Desfigura as verdades objetivas e a prática coletiva que as sustenta.

Essa demolição da verdade objetiva, é gerada para negar a possibilidade de conhecer o mundo e, assim, a possibilidade de o transformar. Atenta contra o direito humano fundamental de criar melhores condições de existência e desenvolvimento de capacidades, sem limite, graças ao desfrute das riquezas naturais e às do produto do trabalho. Até esse ponto, a “pandemia” da “Fake News” intoxica a vida e as culturas, e isso é escandaloso. Entre as agressões perpetradas pelas máquinas de falácias mediáticas, que desempenham um papel considerável, estão os tipos de colapsos decisivos no ponto de vista da vida que tornam o “auditório” preguiçoso sem pensamento crítico e redu-lo (aos olhos da burguesia e seus cúmplices) a inútil, desconfortável e impertinente. A “pandemia” das falácias esmaga o raciocínio livre e torna-o dependente de qualquer lixo idealista; a adesão às falácias esmaga tudo que é engenhoso ou profundo que há no pensamento crítico.

Em geral, as “Fake News” são extravagâncias da irracionalidade que, como todas as extravagâncias, desfiguram a experiência. Há quem apague com falácias mediáticas a própria vivência e a enterre sob os escombros do “absurdo” hegemónico comum. Emboscados pela “pandemia” das “Fake News”, não podemos demonstrar a precisão da nossa maneira de entender e intervir num processo social, avaliando-o com a independência da práxis. Encontramo-nos sujeitos a restringir os nossos direitos humanos (o direito à informação) e, em troca ao colocar-nos ao serviço dos próprios fins do engano, destruímos a realidade e tornamo-nos puramente contemplativos das mentiras que fazemos nossas. Despojados dos nossos direitos, sofremos mutações e tornamo-nos parasitas de generalizações abstratas e especulações subjetivas que agem como “verdades” placebo. É a burocratização da verdade.

Privar-nos do direito de sermos informados não é apenas privar-nos de “dados”, é sepultar uma necessidade social que reduz o ato de informar ao capricho convencionado de uma guerra ideológica alienante. Isso implica uma ofensiva contra a consciência emboscada com uma realidade deformada, desfigurada e desinformada. É uma fraude de ponta a ponta. Não é uma “omissão” mais ou menos interessada ou tendenciosa... não é uma “falha” do método; não é um acidente da lógica narrativa; não é um incidente na composição da realidade; não é uma “peccata minuta” de “descuido”; não é um erro do observador; não é uma miopia técnica, nem é, claro, um “acidente profissional”. É lisa e lhanamente uma canalhada contra o conhecimento, um crime de lesa humanidade. É como privar as pessoas do seu Direito à Educação.

Nestes momentos históricos e, especialmente, na história dos “meios de comunicação”, é insustentável e insuportável qualquer escusa para a informação oportuna, ampla e responsavelmente. Não há direito que justifique a ação deliberada de deturpar o que ocorre e, no pouco provável caso de um “meio de informação” não ter conhecimento do que está ocorrendo, esse suporte não merece respeito algum. A desculpa de “não saber”, de “não conhecer”, de “não ter informação” e, por isso, não assumir responsabilidade profissional e ética... é, francamente suspeito e ridículo. Nenhum povo deveria suportar a falácia induzida pela transmissão de informações que são propriedade social. Existem tecnologia e metodologia suficientes que invalida todo o palavreado esmerado em desculpar as intenções miseráveis ​​daqueles que desinformam e mentem. Mesmo se o fazem mentindo com emboscadas finamente elaboradas em laboratórios de guerra psicológica.

Leia-se criticamente: Artigo 19 “Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui o de não ser molestado por causa das suas opiniões, o de investigar e receber informações e opiniões, e o de difundi-las, sem limitação de fronteiras, por qualquer meio de expressão ”. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Perante todas as canalhadas inventadas pelo capitalismo para violar o legítimo direito dos povos à melhor informação - avaliada ética e cientificamente pelas sociedades - seria bom instruir uma revolução político-jurídica para uma nova Justiça Social, irreversível, que tivesse como eixos prioritários inalienáveis aqueles que competem à Cultura e à Comunicação. Ou, dito de outro modo, que nunca mais a Cultura, a Comunicação – nem a informação -- possam ser impunemente reduzidas, dificultadas ou regateadas pelo interesse da classe dominante contra as necessidades das classes oprimidas. Ser Informado - bem - é um Direito.

Dr. Fernando Buen Abad Domínguez
Diretor do Instituto de Cultura e Comunicação
Sean MacBride Center
Universidade Nacional de Lanús

2 comentários:

Maria João Brito de Sousa disse...

..."Saibamos encontrar no coração

Um lugar pró bom-senso e prá razão

Que a Chave vem do chão, como a semente!"


Abraço!

Olinda disse...

Abad Dominguez,sempre lido com muita atenção.Abraço