quarta-feira, 13 de maio de 2009

A expiação ou a síndrome de 'ex'


A expiação ou a síndrome de ‘ex’

“Mudamos de lugar, mas não mudamos de mundo.”

Matias Aires

Os mais acirrados inimigos do fumador são os ex-fumadores que, para se exorcizarem de um passado que interiorizaram e de que não se conseguem libertar, agridem todos os que usufruem de um prazer que rejeitaram.

São temíveis os que sofrem da «síndrome de ‘ex’». Estes enfermos vivem aterrorizados pelo facto de não conseguirem ‘ser’, por se sentirem perseguidos e apagados pela sombra do que foram e, para procurarem libertar-se dos fantasmas que os flagelam, quais quixotes, esgrimem contra o seu passado procurando, sem o conseguirem, afirmar-se no presente.

O ‘ex’ não é, foi. E neste axioma reside o seu drama.

Há os ‘ex’ que cansados, com dignidade, baixaram os braços desistindo da luta, outros não resistem sem dar a sua ferroada quando as mudanças climatéricas lhes avivam os humores, mas outrosque, com armas e bagagens, fazendo-se acompanhar por todo o folclore da comunicação social, orquestrada pela SIC ou CIP é igual, mudaram de trincheira, renegando tudo pelo que pugnaram e passando a defender e impor o seu contrário.

Quando de um debate televisivo apresentaram a euro-deputada Ilda Figueiredo, tendo à sua direita Vital Moreira e à esquerda Miguel Portas, a reacção dos que me rodeavam não se fez esperar: “olha os dois ex-comunistas”. E serão sempre, porque nessa situação se afirmaram e foram respeitados. Hoje sentem-se humilhados pelo modo irónico como são referidos e sem o respeito que lhes foi devido, daí os seus ódiozinhos cegos, as provocações venais e o constante gotejar de veneno contra os que se mantêm firmes nas suas convicções.

Pode eliminar-se o ferrete nas alimárias, mas as marcas persistem nas cicatrizes sempre incomodativas e, por vezes, dolorosas que, provocando irritações constantes, fazem-nas perder o controlo emocional, escoiceando sempre que confrontadas com alguma sonoridade que lhes recorde o passado, tornando perigosos os seus arremessos.

Os ‘ex’ nos seus desvarios sentem-se flagelados por obsessões de expiação, como se crimes tivessem cometido e, besuntando-se com unguentos, seguidos de duches frios, expõem-se nus ao luar. Esta patologia está oficialmente reconhecida como a «síndrome de ‘ex’».

Sonham com o convívio leal e a fraternidade que nunca mais encontraram e desviam o olhar ao cruzarem-se com aqueles ao lado dos quais lutaram contra os que hoje defendem.

No seu novo estatuto, e porque sabem que são elementos descartáveis, excedem-se nos meios que utilizam e, assim, de degrau em degrau descem às mais reles provocações procurando a humilhação e nesse exorcismo aliviar a carga emocional acumulada.

Um bom ‘ex’ que se preze escreve um livro de catarse, sendo-lhe atribuído lugar cativo nos jornais ditos de referência como cronista, politólogo ou fazedor de opinião. É chamado para debates ou combates ou, simplesmente, para lançar alguns disparates nas televisões.

Os ‘ex’ de renegados num ápice são promovidos a heróis, ex…cepcionais.

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