sexta-feira, 27 de março de 2015

Mentiras e embustes à Esquerda: a política de autodestruição - James Petras


Mentiras e embustes à Esquerda: a política de autodestruição
Por Prof. James Petras, 22 de março de 2015

O que, durante o ano passado, aparecia como sinal de esperança, de que governos de Esquerda estavam a surgir como alternativas poderosas a regimes de direita pró-EUA, está a transformar-se em debandada histórica, que vai relegá-los ao caixote de lixo da história por muitos anos.
A ascensão e decadência rápida dos governos de esquerda em França, Grécia e Brasil não é o resultado de um golpe militar, nem é devido a maquinações da CIA. A derrocada dos governos de esquerda é resultado de decisões políticas deliberadas, que romperam decisivamente com programas progressivos, promessas e compromissos que os líderes políticos tinham feito para a grande massa de eleitores das classes trabalhadora e média que os elegeram.
Cada vez mais, o eleitorado vê os governantes esquerdistas como traidores, que traíram os seus apoiantes perante o aceno e chamamento dos seus mais flagrantes inimigos de classe: os banqueiros, os capitalistas e os ideólogos neoliberais.

Governos de Esquerda cometem suicídio

A autodestruição da esquerda é uma vitória inesperada para as forças políticas neoliberais mais retrógradas. Estas forças têm procurado destruir o sistema de previdência social, impor o seu domínio através de funcionários não eleitos, alargar e aprofundar desigualdades, minar os direitos dos trabalhadores, privatizar e desnacionalizar os setores mais lucrativos da economia.
Três casos de traição de regimes de Esquerda servem para destacar este processo: o regime socialista francês do presidente François Hollande que governa a segunda potência líder na Europa (2012-2015); Syriza, o regime de esquerda na Grécia eleito em 25 de janeiro de 2015, retratado como um valoroso defensor de uma política alternativa à "austeridade fiscal"; e o Partido dos Trabalhadores do Brasil, que governa o maior país (2003-2015) da América Latina e um dos líderes dos BRICS.

“Socialismo” Francês: o grande salto atrás

Na sua campanha presidencial, François Hollande prometeu aumentar os impostos sobre os ricos até 75%; reduzir a idade de aposentação de 62 para 60 anos; lançar um programa de investimento público maciço para reduzir o desemprego; aumentar consideravelmente o gasto público em educação (contratando 60.000 novos professores), saúde e habitação social; e retirar as tropas francesas do Afeganistão como um primeiro passo para reduzir o papel de Paris enquanto colaborador imperialista.
De 2012, quando foi eleito, até ao presente (março de 2015), François Hollande traiu todos e cada um dos seus compromissos políticos: os investimentos públicos não se concretizaram e o desemprego aumentou para mais de 3 milhões. O seu recém-nomeado Ministro da Economia Emmanuel Macron, ex-sócio do Banco Rothschild, reduziu drasticamente os impostos das empresas em 50 mil milhões de euros. O seu recém-nomeado Primeiro-Ministro Manuel Valls, um fanático neoliberal, implementou grandes cortes em programas sociais, enfraqueceu a regulamentação governamental das empresas e bancos e corroeu a segurança no emprego. Hollande nomeou Laurence Boone do Banco da América como seu principal assessor económico.
O “Presidente Socialista” Francês enviou tropas para o Mali, bombardeiros para a Líbia, conselheiros militares para a junta da Ucrânia e ajudou os chamados “rebeldes” sírios (na sua maioria mercenários jihadistas). Assinou vendas de milhares de milhões de euros de material militar para a monarco-ditadura da Arábia Saudita e renegou um contrato de venda de navios de guerra à Rússia. Hollande juntou-se à Alemanha na exigência de que o governo grego cumpra com o pagamento total e pronto da dívida aos banqueiros privados e mantenha o seu brutal "programa de austeridade".
Como resultado de ter defraudado os eleitores franceses, traindo os trabalhadores e abraçando banqueiros, grandes empresas e militaristas, menos de 19% do eleitorado tem uma visão positiva do governo "socialista", colocando-o em terceiro lugar entre os principais partidos. As políticas pro-Israel de Hollande e a sua linha dura nas negociações de paz EUA-Irão, os ataques islamofóbicos do ministro Vall nos subúrbios muçulmanos franceses e o suporte a intervenções militares contra movimentos Islâmicos, têm polarizado crescentemente a sociedade francesa e aumentado a violência étnico-religiosa no país.

Grécia: transformação instantânea do Syriza

Desde que o Syriza ganhou as eleições gregas, em 25 de janeiro de 2015, até meados de março, Alexis Tsipras, o primeiro-ministro e Yanis Varoufakis, seu ministro das Finanças nomeado, renegaram em rápida ordem o programa eleitoral. Abraçaram as mais retrógradas medidas, procedimentos e relações com a 'troika' (FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu) que o Syriza tinha denunciado no seu programa de Tessalónica pouco tempo antes.
Tsipras e Varoufakis repudiaram a promessa de rejeitar os ditames da ‘Troika'. Por outras palavras, aceitaram o domínio colonial e a continuação da vassalagem.
Típico da sua demagogia e mentiras foi a tentativa de encobrir a sua submissão à universalmente odiada 'Troika' renomeando-a de 'a Instituição' – não enganando ninguém a não ser a si próprios – e tornando-se alvo de gargalhadas cínicas dos seus supervisores da UE.
Durante a campanha, o Syriza tinha prometido cancelar a totalidade ou a maior parte da dívida grega. No governo, Tsipras e Varoufakis imediatamente asseguraram à Troika que reconheciam e prometiam cumprir com todas as obrigações da dívida.
O Syriza prometera dar prioridade aos gastos humanitários em relação à austeridade – aumento do salário mínimo, recontratação de funcionários públicos na Saúde e Educação, aumento das pensões. Após duas semanas de bajulação servil, os "reformados” Tsipras e Varoufakis deram prioridade à austeridade – efetuando pagamentos da dívida e adiando mesmo o mais magro dispêndio anti pobreza. Quando a Troika emprestou ao regime do Syriza 2 mil milhões de dólares para alimentar gregos famintos, Tsipras elogiou os seus supervisores e prometeu apresentar uma lista de milhares de milhões de "reformas" regressivas.
O Syriza prometeu reexaminar as privatizações duvidosas do regime de direita anterior de empresas públicas lucrativas, parar as privatizações em curso e futuras. No governo, Tsipras e Varoufakis rapidamente desmentiram essa promessa. Aprovaram privatizações passadas, presentes e futuras.

De facto mostraram-se abertos a conseguir novos "parceiros" de privatização oferecendo benefícios fiscais lucrativos na venda de mais empresas públicas.
O Syriza prometeu combater o nível depressivo de desemprego (26% nacional, 55% dos jovens), através de gastos públicos e redução de pagamentos da dívida. Tsipras e Varoufakis cumpriram obedientemente os pagamentos da dívida e não atribuíram quaisquer fundos à criação de postos de trabalho!
Não só o Syriza continuou as políticas de seus antecessores de direita, mas fê-lo também com um estilo e substância ridículos assumindo posturas públicas ridículas e gestos inconsequentes demagógicos: num dia Tsipras coloca uma coroa de flores no túmulo de 200 partidários gregos assassinados pelos nazis durante a Segunda Guerra Mundial. No dia seguinte rasteja diante dos banqueiros alemães e cede às suas exigências de austeridade orçamentária, sonegando fundos públicos a 2 milhões de gregos desempregados. Uma tarde, o ministro das Finanças Varoufakis posa para uma foto publicada no Paris Match que o apresenta, cocktail na mão, no terraço da sua casa de cobertura com vista para a Acrópole; e várias horas depois, ele tem a pretensão de falar para as massas empobrecidas!
Traição, engano e demagogia tudo durante os dois primeiros meses de mandato, o Syriza estabeleceu um recorde na sua conversão de partido anti austeridade de esquerda num partido conformista, vassalo servil da União Europeia.
A demanda de Tsipras à Alemanha para que pague indemnizações por danos causados à Grécia durante Segunda Guerra Mundial – reclamação justa e devida há muito – é outro estratagema demagógico e falso concebido para distrair os gregos empobrecidos da cedência de Tsipras e Varoufakis às presentes exigências de austeridade alemãs. Um funcionário cínico da União Europeia disse ao Financial Times (12/3/15, p. 6), "ele (Tsipras) está a dar-lhes (militantes Syriza) um osso para lamber".
Ninguém espera que os líderes alemães alterem a sua linha-dura por causa de injustiças do passado, muito menos, porque os seus interlocutores têm os joelhos dobrados. Ninguém na UE toma a demanda de Tsipras pelo seu valor facial. Veem isso mais como retórica 'radical' vazia para consumo interno.
Falar de reparações alemãs com 70 anos evita a tomada de ação prática hoje, de rejeição ou redução dos pagamentos de dívida ilegítima aos bancos alemães e de repúdio dos ditames de Merckel. A traição transparente dos seus compromissos mais básicos para com o povo grego empobrecido já dividiu o Syriza. Mais de 40% do comité central, incluindo o presidente do Parlamento, rejeitou os acordos Tsipras-Varoufakis com a Troika.
A grande maioria dos gregos, que votaram Syriza, esperava algum alívio imediato e reformas. Estão cada vez mais desencantados. Não esperavam que Tsipras nomeasse Yanis Varoufakis, um ex-assessor económico do corrupto líder neoliberal do PASOK George Papandreou, como ministro das Finanças. Nem muitos eleitores abandonaram o PASOK em massa, ao longo dos últimos cinco anos, apenas para encontrar os mesmos cleptocratas e oportunistas sem escrúpulos em posições de topo no Syriza, graças ao dedo indicador de Alexis Tsipras.

Nem poderia o eleitorado esperar qualquer luta, resistência e vontade de romper com a Troika a partir das nomeações de Tsipras de professores anglo-gregos expatriados. Esses esquerdistas de poltrona (“seminaristas marxistas”) nem se engajaram em lutas de massas nem sofreram as consequências da prolongada depressão. O Syriza é um partido liderado por profissionais, académicos e intelectuais em ascensão. Eles governam sobre (mas em nome de) a classe trabalhadora empobrecida e assalariados da classe média baixa mas no interesse dos banqueiros gregos e, especialmente, alemães.
Dão prioridade à afiliação na UE sobre uma política económica nacional independente. São fiéis à OTAN no apoio à junta de Kiev na Ucrânia, nas sanções da UE à Rússia, na intervenção da OTAN na Síria e Iraque, e mantêm um silêncio ruidoso em relação às ameaças militares dos EUA à Venezuela!

Brasil: os cortes no orçamento, a corrupção e a revolta das massas

O governo do autodenominado Partido dos Trabalhadores do Brasil, no poder há uns azarados 13 anos, tem sido um dos regimes da América Latina mais afetado pela corrupção. Apoiado por uma das principais confederações do Trabalho e várias organizações de trabalhadores rurais sem terra, e partilhando o poder com partidos de centro-esquerda e de centro-direita, foi capaz de atrair dezenas de milhares de milhões de dólares de capital financeiro, extrativo e do agronegócio. Graças a uma década de acentuado desenvolvimento de bens e serviços (commodities) no setor agromineiro, crédito fácil e baixas taxas de juros, o governo aumentou a receita, o consumo e o salário mínimo enquanto multiplicava os lucros da elite económica.
Na sequência das crises financeiras de 2009, bem como do declínio dos preços dos bens e serviços, a economia estagnou assim que a nova presidente Dilma Rousseff foi eleita. O governo de Dilma Rousseff, como o do seu antecessor, Lula da Silva, favoreceu o agronegócio face às reclamações de reforma agrária dos trabalhadores rurais sem-terra. O seu regime apoiou os barões da madeira e os produtores de soja na usurpação de comunidades indígenas e da floresta húmida amazónica.
Eleita para um segundo mandato, Rousseff defrontou-se com importantes crises políticas e económicas: o aprofundamento da recessão económica, o défice fiscal, a detenção e acusação de dezenas de deputados federais corruptos do Partido dos Trabalhadores e seus aliados e de executivos da Petrobras. Os líderes do Partido dos Trabalhadores e a tesouraria da campanha do Partido receberam milhões de dólares em propinas de empresas de construção para garantirem contratos com a gigante companhia petrolífera semipública.
Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma Rousseff prometeu "continuar a apoiar programas sociais populares" e "acabar com a corrupção". No entanto, imediatamente após a sua eleição, abraçou políticas neoliberais ortodoxas e nomeou um gabinete de neoliberais de extrema-direita, incluindo o banqueiro do Bradesco Joaquin Levy como ministro das Finanças. Levy propôs reduzir o subsídio de desemprego, as pensões e os salários públicos. Defendeu uma maior desregulamentação da Banca. Propôs enfraquecer as leis de proteção do Trabalho para atrair Capital. Procurou alcançar um excedente orçamental e atrair investimento estrangeiro em detrimento do Trabalho.
Rousseff, coerente com o seu abraço da ortodoxia neoliberal, nomeou Katia Abreu, uma senadora de direita, líder, ao longo da vida, dos interesses do agronegócio e inimiga jurada da reforma agrária, como novo ministro da Agricultura. Cognominada "Senhorita Desflorestação" pelo Greenpeace, a senadora Abreu teve a oposição veemente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Confederação do Trabalho, sem resultado.
Com o apoio total de Rousseff, Abreu traçou o caminho para acabar até mesmo com a minimalista redistribuição de terras realizada durante o primeiro mandato de Dilma no governo (estabelecendo povoamentos de terras que beneficiam menos de 10% dos ocupantes sem terra). Abreu aprovou regulamentos que facilitam a expansão de culturas geneticamente modificadas e promete expulsar à força índios da Amazónia que ocupam terras produtivas, em benefício das grandes corporações do agronegócio. Além disso, promete defender vigorosamente os proprietários das ocupações de terras por trabalhadores rurais sem terra.
A incapacidade e/ou falta de vontade de Dilma para despedir e processar o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, envolvido num escândalo de milhares de milhões de dólares de propinas e subornos ao longo de uma década, aprofundou e ampliou a oposição das massas. Em 15 março de 2015 mais de um milhão de brasileiros encheu as ruas em todo o país liderados por partidos de direita mas atraindo o apoio das classes populares exigindo julgamentos anticorrupção imediatos e sentenças severas e a revogação dos cortes de Levy em gastos sociais.
A contramanifestação de apoio a Dilma Rousseff organizada pela confederação sindical CUT e o MST atraiu um décimo desse número - cerca de 100.000 participantes. Dilma respondeu apelando ao "diálogo" e afirmou estar "aberta a propostas" sobre a questão da corrupção, mas rejeitou explicitamente qualquer mudança das suas políticas fiscais regressivas, das nomeações de neoliberais para o gabinete e adoção das respetivas agendas agromineiras.
Em menos de dois meses, o Partido dos Trabalhadores e o seu Presidente mancharam indelevelmente os seus dirigentes, políticas e apoiantes com a vassoura da corrupção e políticas socialmente regressivas. O apoio popular mergulhou a pique. A direita está a crescer. Até mesmo os ativistas autoritários pró-golpe militar estiveram presentes nas manifestações de massas, carregando cartazes a pedir o "impeachment" e o retorno a um regime militar.
Como na maior parte da América Latina, a direita autoritária no Brasil é uma força crescente, posicionando-se para tomar o poder visto que o centro-esquerda adota uma agenda neoliberal em toda a região. Partidos apelidados de "centro-esquerda", como a Frente Ampla no Uruguai, o pró-governamental Partido para a Vitória na Argentina, estão aprofundando os seus laços com o capitalismo das corporações agromineiras.
Afirmações desinformadas de escritores norte-americanos de esquerda como Noam Chomsky de que, "A América Latina é a vanguarda contra o neoliberalismo" estão, na melhor das hipóteses, atrasadas uma década e são certamente enganadoras. Eles estão iludidos por pronunciamentos políticos populistas e recusam-se a reconhecer a decadência dos regimes de centro-esquerda falhando, por conseguinte, no reconhecimento de que as ações políticas neoliberais desses regimes estão a promover o descontentamento popular de massas. Regimes que adotam políticas socioeconómicas regressivas não constituem a vanguarda da emancipação social...

Conclusão

Qual a explicação para essas reversões abruptas e promessas rapidamente quebradas por recém-eleitos supostamente "partidos de esquerda" na Europa e na América Latina?

Tem-se vindo a esperar esse tipo de comportamento na América do Norte, nos Democratas de Obama ou no Novo Partido Democrático no Canadá… Mas fomos levados a crer que, em França, com as suas tradições republicanas vermelhas, um regime socialista apoiado (“criticamente”) por anticapitalistas de esquerda pelo menos implementaria reformas sociais progressivas.
Foi-nos dito por um exército de bloggers progressistas que o Syriza, com o seu líder carismático e retórica radical iria, no mínimo, cumprir as suas promessas mais elementares levantando o jugo da dominação da Troika e começando a acabar com a miséria e a fornecer eletricidade para 300.000 famílias à luz de velas.
“Progressistas” tinham-nos repetidamente dito que o Partido dos Trabalhadores tirou 30 milhões da pobreza. Alegavam que um “honesto antigo trabalhador auto" (Lula da Silva) nunca permitiria que o Partido dos Trabalhadores voltasse aos cortes neoliberais no orçamento e abraçasse o seus supostos “inimigos de classe”. Professores de esquerda dos EUA recusaram-se a dar crédito ao roubo crasso de milhares de milhões de dólares do Tesouro Nacional do Brasil sob o governo de dois presidentes do Partido dos Trabalhadores.
Várias explicações para essas traições políticas vêm à mente. Em primeiro lugar, apesar das suas reivindicações populares ou “obreiristas”, esses partidos foram tomados por burocratas sindicais, profissionais e advogados de classe média, organicamente desligados das respetivas bases de massas. Durante as campanhas eleitorais, em busca de votos, abraçavam brevemente os trabalhadores e os pobres, e, em seguida, passavam o resto do seu tempo em restaurantes caros a negociar "acordos" com banqueiros, outorgantes de subornos de negócios e investidores estrangeiros para financiar a sua próxima eleição, a escola privada dos seus filhos e os apartamentos de luxo das suas amantes...
Durante um tempo, quando a economia estava a crescer, os grandes lucros das empresas, pagamentos e subornos passavam de mão em mão a par de aumentos salariais e programas de combate à pobreza. Mas quando a crise eclodiu, os líderes "populares" descartaram o chapéu do partido e declararam que “a austeridade fiscal era inevitável” enquanto iam com os seus copos mendigar junto dos seus senhores financeiros internacionais.
Em todos estes países, confrontando-se com tempos difíceis, os líderes de classe média da Esquerda temeram o problema (crise do capitalismo) e temeram a solução real (transformação radical). Em vez disso, voltaram-se para a "única solução": aproximaram-se dos líderes capitalistas e procuraram convencer as associações empresariais e, acima de tudo, os seus senhores financeiros, de que eram "políticos sérios e responsáveis" dispostos a abandonar as agendas sociais e a abraçar a disciplina fiscal. Para consumo doméstico amaldiçoaram e ameaçaram as elites, proporcionando um pequeno teatro para entreter os seus seguidores plebeus, antes de capitularem!
Nenhuns dos académicos que se tornaram líderes de esquerda têm qualquer ligação profunda e duradoura com a luta de massas. O seu ativismo envolve a leitura de artigos em "fóruns sociais" e a apresentação de trabalhos em conferências sobre “emancipação e igualdade”. As traições políticas e a austeridade fiscal não comprometerão as suas posições económicas. Se os partidos de esquerda forem depostos por eleitores irritados e movimentos sociais radicais, os líderes de esquerda fazem as malas e voltam para os cargos confortáveis de que são titulares ou regressam aos seus escritórios de advocacia. Não têm que se preocupar com despedimentos em massa ou pensões de subsistência reduzidas. No seu lazer vão encontrar tempo para se sentar e escrever um outro artigo sobre a forma como a “crise do capitalismo” minou a sua bem-intencionada agenda social ou como eles experienciaram a “crise da Esquerda".
Devido à sua desconexão do sofrimento dos pobres, dos eleitores desempregados, os esquerdistas de classe média em funções são cegos para a necessidade de fazer uma rutura com o sistema. Na realidade, eles compartilham a visão do mundo dos seus supostamente adversários conservadores: também acreditam que "é capitalismo ou caos”. Este cliché emprestado passa por conhecimento profundo sobre os dilemas dos socialistas democráticos. Os funcionários e assessores esquerdistas de classe média recorrem sempre ao álibi de “constrangimentos institucionais”. “Teorizam” a sua impotência política – nunca reconhecem o poder dos movimentos de classe organizados. A sua cobardia política é estrutural e leva com facilidade a traições morais: pleiteiam que "crise não é tempo de consertar o sistema". Para a classe média, "tempo" torna-se uma desculpa política. Líderes de classe média dos movimentos populares, sem audácia ou programas de luta, falam sempre de mudança... No futuro...
Em vez de luta de massas, eles correm para lá e para cá, entre os centros de poder financeiro e os seus comités centrais, confundindo "diálogos", que terminam em submissão, com resistência consequente. No final, o povo pagar-lhes-á voltando-lhes as costas e rejeitando os seus pedidos de reeleição “para outra oportunidade”. Não haverá outra oportunidade. Esta “Esquerda” ficará desacreditada aos olhos daqueles cuja confiança traíram.
A tragédia é que toda a esquerda ficará manchada. Quem pode acreditar nas belas palavras de “libertação”, “a vontade de esperança” e "o retorno da soberania " depois de experimentar anos do contrário?
As políticas de esquerda serão perdidas para toda uma geração, pelo menos no Brasil, França e Grécia. A Direita vai ridicularizar o fecho aberto de Hollande; a falsa humildade de Rousseff; os gestos ocos de Tsipras e a frivolidade de Varoufakis. O povo amaldiçoará a sua memória e traição de uma causa nobre.

Traduzido por CG

1 comentário:

Olinda disse...

E ser de esquerda hoje,nao ê ser anticapitalista?E quem tem todo o interesse em alimentar esta pseudo-esquerda?Havia aqui muito para reflectir...

Abraco e bom fim de semana