Humanismo urgente
“Salvar a humanidade”: moral e ética
do século XXI (também)
Por
Fernando Buen Abad
Uma Revolução Cultural chamada humanismo. Contra as desesperanças e as
depressões, urge um Humanismo renovado no seu caráter emancipador e
mobilizador. Urge nas afirmações supremas das lutas sociais, como Marx pensava, à luz da
História, e indivisível no conteúdo consciente insuflado pelas forças sociais
nas suas lutas. Humanismo de "novo género" como solução possível para
as forças baseadas na democracia participativa. Humanismo, hoje mais necessário
que nunca, para não sucumbir ao mercantilismo extremo e à opressão ideológica
mais feroz na subtração da mais-valia. Humanismo contra o capitalismo selvagem
"per se", que não se detém
ante nada, que devora a natureza, que destrói o património cultural,
financiando os negócios das guerras, dos bancos e dos "mass media".
Muitos pensam, não sem razão, que
toda a luta que tenha como prioridade suprema o desenvolvimento de sociedades
emancipadas (sem opressores nem oprimidos) já contém a ideia de Humanismo. Que,
em qualquer caso, invocar o Humanismo exige atualizá-lo contra qualquer
emboscada ideológica que o reduza ao individualismo. Que o Humanismo
necessário, neste momento da História, deve ter um programa concreto de ação
direta que não sirva para esconder a luta de classes e, tão-pouco, eclipse a
também urgente tarefa de salvar o planeta. Em todo o caso um Humanismo
antitético do capitalismo. Ainda que haja quem creia que é um tanto “vulgar” falar
de Humanismo, é necessário ratificar o que mil vozes propuseram para um Humanismo
de novo género, sem ilusionismos nem idealismos.
Quem imaginaria que a espécie
humana, ao olhar-se à beira do abismo neoliberal, se inspiraria para iniciar a sua
própria transformação e converter-se, ela própria, numa Revolução Cultural? Temos
uma história latino-americana sobre um Humanismo nosso (Guadarrama) desprendido
das lutas contra o colonialismo, a alienação e a exclusão, História que possui
heranças extraordinárias cozinhadas entre os vapores de combate (Fidel) como projeto dos
povos oprimidos. Mas o humanismo não aceita sectarismos territoriais. Herança plena
de posições anticapitalistas, declarando-se abertamente pela necessidade de
encontrar paz com identidade e dignidade para todos e em todo o mundo. (Martí) Um Humanismo
que também é de paz, sem abandonar uma só das suas armas. (Fernández
Retamar)
A história exige-nos que
ratifiquemos o Humanismo, como um projeto emancipador, porque é necessário e
útil não só para uma crítica "recarregada" contra o capitalismo, mas
porque impõe uma rota precisa para não nos perdermos em emboscadas ideológicas.
E isso também implica uma Guerrilha Semiótica no coração do Humanismo, as suas
heranças, as desfigurações infligidas, a escravidão a que tem sido submetida ao
capricho de verborreias filantrópicas escapistas, distintas. Para a construção
ou consolidação de tal Humanismo, para reforçar a sua capacidade mobilizadora nas
massas, exigimos um Humanismo objetivo, como um programa que ascende à prática de
forma inconfundível, convertido em carne da luta, até alcançar o seu ponto de não
retorno no imediato. (Chávez).
Tal Humanismo entranha a consciência
que o anceia, a sua possibilidade e sua realização (o desejável, o possível e o
realizável: Sánchez
Vázquez) porque evidencia os valores que dignificam a espécie humana que
renova a sua moral de luta, ou seja, revolucionária, que é o seu mais alto degrau
(Ché) e coloca ao
alcance de toda a compreensão o valor da sua consolidação imediata. Irrefutável
e valioso porque justifica a sua natureza axiológica na superioridade dos seus
valores contra todo o sistema opressor e explorador. Porque mobiliza todos até
uma meta que pode ser alcançada se cumprirmos com os nossos compromissos pela
unidade e organização dos povos. (Perón, Puiggros, Jaramillo).
Não se trata de um Humanismo
reformista ou anestésico nem decorativo, do que se trata é de transformar o
mundo existente e não de conservá-lo ou de com ele nos reconciliarmos. (Mondolfo) Trata-se
sim de um Humanismo como programa do imediato capaz de elevar a consciência,
com reivindicações de liberdade, igualdade, justiça e democracia, até passar
dos bons desejos à sua realização concreta. Humanismo para mudar o modo de
produção e as relações de produção. Humanismo para não perder as esperanças de
lutar contra subterfúgios e ampliar as liberdades, a igualdade e justiça
social. Humanismo, democrático e pleno, de seres humanos livres e criativos. (Althuser)
Insistamos. Trata-se de uma conceção
do Humanismo ligado à crítica social. Não um Humanismo abstrato ou filantrópico
burguês, não reduzido a um ponto de vista gnosiológico, mas ativado como uma
ação social transformadora. Humanismo real "renovado". Humanismo de
uma nova (renovada) integridade moral, ética e estética necessariamente
histórica e social para a agir no coração, na barriga e no cérebro das relações
sociais. Humanismo de um tempo e um lugar concretos para a Revolução cultural e
científica que nos permite assumir a realidade em termos de significado, desta
vez, transformando o mundo. (Mészáros)
Expressão crítica da história, seus
processos políticos e económicos... a ideologia da classe dominante. O Humanismo
como medida que reforme a fé objetiva num mundo humano, capaz de humanizar o
que toque. Ou, noutros termos, Humanismo, onde o poder do humano seja criação
que emana e renova, sem limites. Humanismo expressão de liberdade, de espiritualidade
concreta, do verdadeiramente criador, projétil contra a mediocridade, o vazio
espiritual e o "gosto" banal... Humanismo para elevar a consciência da
realidade com seus próprios meios coletivos.
Humanismo atento à dialética
cultural das lutas entre classes sociais e sensível à dialética, realmente
existente, do internacionalismo e os sentimentos nacionais. Humanismo pela vida
e contra tudo o que a corrói, destrói ou deprime. Humanismo como ética da
resistência. Também.
A essência humana exige a sua
emancipação revolucionando as relações sociais. Isso requer um Humanismo produto
da sua própria práxis, transformando-se também nas suas próprias
circunstâncias. Humanismo pleno, histórico e criador. Tal Humanismo não pode
nascer senão no próprio coração da barbárie capitalista, é a sua contradição
mais aguda. Foi chamado como força emergente superadora de uma etapa histórica
amplamente “desumanizada”, vergonhosa e macabra. Humanismo que deve reunir o
melhor dos seres humanos para rejuvenescer em nós e connosco. Humanismo como
uma conceção lógica da política e como ética do coletivo. Uma ideia do humano
que, no entanto, sem lançar a filosofia ao mar, permite distinguir claramente
os territórios das suas lutas mais concretas e imediatas. Do que se trata é de
o acrisolar na práxis. Estamos a tempo.
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