quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Humanismo urgente - Por Fernando Buen Abad

Humanismo urgente

“Salvar a humanidade”: moral e ética do século XXI (também)

 Por Fernando Buen Abad

  Uma Revolução Cultural chamada humanismo. Contra as desesperanças e as depressões, urge um Humanismo renovado no seu caráter emancipador e mobilizador. Urge nas afirmações supremas das lutas sociais, como Marx pensava, à luz da História, e indivisível no conteúdo consciente insuflado pelas forças sociais nas suas lutas. Humanismo de "novo género" como solução possível para as forças baseadas na democracia participativa. Humanismo, hoje mais necessário que nunca, para não sucumbir ao mercantilismo extremo e à opressão ideológica mais feroz na subtração da mais-valia. Humanismo contra o capitalismo selvagem "per se", que não se detém ante nada, que devora a natureza, que destrói o património cultural, financiando os negócios das guerras, dos bancos e dos "mass media".

Muitos pensam, não sem razão, que toda a luta que tenha como prioridade suprema o desenvolvimento de sociedades emancipadas (sem opressores nem oprimidos) já contém a ideia de Humanismo. Que, em qualquer caso, invocar o Humanismo exige atualizá-lo contra qualquer emboscada ideológica que o reduza ao individualismo. Que o Humanismo necessário, neste momento da História, deve ter um programa concreto de ação direta que não sirva para esconder a luta de classes e, tão-pouco, eclipse a também urgente tarefa de salvar o planeta. Em todo o caso um Humanismo antitético do capitalismo. Ainda que haja quem creia que é um tanto “vulgar” falar de Humanismo, é necessário ratificar o que mil vozes propuseram para um Humanismo de novo género, sem ilusionismos nem idealismos.

Quem imaginaria que a espécie humana, ao olhar-se à beira do abismo neoliberal, se inspiraria para iniciar a sua própria transformação e converter-se, ela própria, numa Revolução Cultural? Temos uma história latino-americana sobre um Humanismo nosso (Guadarrama) desprendido das lutas contra o colonialismo, a alienação e a exclusão, História que possui heranças extraordinárias cozinhadas entre os vapores de combate (Fidel) como projeto dos povos oprimidos. Mas o humanismo não aceita sectarismos territoriais. Herança plena de posições anticapitalistas, declarando-se abertamente pela necessidade de encontrar paz com identidade e dignidade para todos e em todo o mundo. (Martí) Um Humanismo que também é de paz, sem abandonar uma só das suas armas. (Fernández Retamar)

A história exige-nos que ratifiquemos o Humanismo, como um projeto emancipador, porque é necessário e útil não só para uma crítica "recarregada" contra o capitalismo, mas porque impõe uma rota precisa para não nos perdermos em emboscadas ideológicas. E isso também implica uma Guerrilha Semiótica no coração do Humanismo, as suas heranças, as desfigurações infligidas, a escravidão a que tem sido submetida ao capricho de verborreias filantrópicas escapistas, distintas. Para a construção ou consolidação de tal Humanismo, para reforçar a sua capacidade mobilizadora nas massas, exigimos um Humanismo objetivo, como um programa que ascende à prática de forma inconfundível, convertido em carne da luta, até alcançar o seu ponto de não retorno no imediato. (Chávez).

Tal Humanismo entranha a consciência que o anceia, a sua possibilidade e sua realização (o desejável, o possível e o realizável: Sánchez Vázquez) porque evidencia os valores que dignificam a espécie humana que renova a sua moral de luta, ou seja, revolucionária, que é o seu mais alto degrau (Ché) e coloca ao alcance de toda a compreensão o valor da sua consolidação imediata. Irrefutável e valioso porque justifica a sua natureza axiológica na superioridade dos seus valores contra todo o sistema opressor e explorador. Porque mobiliza todos até uma meta que pode ser alcançada se cumprirmos com os nossos compromissos pela unidade e organização dos povos. (Perón, Puiggros, Jaramillo).

Não se trata de um Humanismo reformista ou anestésico nem decorativo, do que se trata é de transformar o mundo existente e não de conservá-lo ou de com ele nos reconciliarmos. (Mondolfo) Trata-se sim de um Humanismo como programa do imediato capaz de elevar a consciência, com reivindicações de liberdade, igualdade, justiça e democracia, até passar dos bons desejos à sua realização concreta. Humanismo para mudar o modo de produção e as relações de produção. Humanismo para não perder as esperanças de lutar contra subterfúgios e ampliar as liberdades, a igualdade e justiça social. Humanismo, democrático e pleno, de seres humanos livres e criativos. (Althuser)

Insistamos. Trata-se de uma conceção do Humanismo ligado à crítica social. Não um Humanismo abstrato ou filantrópico burguês, não reduzido a um ponto de vista gnosiológico, mas ativado como uma ação social transformadora. Humanismo real "renovado". Humanismo de uma nova (renovada) integridade moral, ética e estética necessariamente histórica e social para a agir no coração, na barriga e no cérebro das relações sociais. Humanismo de um tempo e um lugar concretos para a Revolução cultural e científica que nos permite assumir a realidade em termos de significado, desta vez, transformando o mundo. (Mészáros)

Expressão crítica da história, seus processos políticos e económicos... a ideologia da classe dominante. O Humanismo como medida que reforme a fé objetiva num mundo humano, capaz de humanizar o que toque. Ou, noutros termos, Humanismo, onde o poder do humano seja criação que emana e renova, sem limites. Humanismo expressão de liberdade, de espiritualidade concreta, do verdadeiramente criador, projétil contra a mediocridade, o vazio espiritual e o "gosto" banal... Humanismo para elevar a consciência da realidade com seus próprios meios coletivos.

Humanismo atento à dialética cultural das lutas entre classes sociais e sensível à dialética, realmente existente, do internacionalismo e os sentimentos nacionais. Humanismo pela vida e contra tudo o que a corrói, destrói ou deprime. Humanismo como ética da resistência. Também.

A essência humana exige a sua emancipação revolucionando as relações sociais. Isso requer um Humanismo produto da sua própria práxis, transformando-se também nas suas próprias circunstâncias. Humanismo pleno, histórico e criador. Tal Humanismo não pode nascer senão no próprio coração da barbárie capitalista, é a sua contradição mais aguda. Foi chamado como força emergente superadora de uma etapa histórica amplamente “desumanizada”, vergonhosa e macabra. Humanismo que deve reunir o melhor dos seres humanos para rejuvenescer em nós e connosco. Humanismo como uma conceção lógica da política e como ética do coletivo. Uma ideia do humano que, no entanto, sem lançar a filosofia ao mar, permite distinguir claramente os territórios das suas lutas mais concretas e imediatas. Do que se trata é de o acrisolar na práxis. Estamos a tempo.


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