Coimbra, 1 de Março de 1979
A política é para eles
uma promoção e para mim uma aflição. E não há entendimento possível entre nós,
apesar do meu esforço. Separa-nos um fosso da largura da verdade. Radicalmente insinceros,
nenhum pudor os inibe. Mentem com tal convicção que se enganam a si próprios, e
acabam por acreditar que são o que fingem ser. Levam-se a sério no papel de
homens providenciais que dão ordem à desordem, virtude ao vício, luz à
escuridão. Que outorgam a liberdade apenas a nomeá-la do alto das tribunas. E
nem sequer consigo fazê-los compreender que representam sem originalidade uma
farsa velha como os tempos, e que os aplausos que recebem já outros os
receberam, igualmente inconsequentes e requentados. Narcisos numa sala de
espelhos, confirmam-se em cada imagem multiplicada. A circunstância não os
circunstancia. Pelo contrário. Vaticina-lhes a duração. O efémero é um anátema
dos outros. Vêem na presença actual do nome nos jornais a garantia da perpetuação
nos anais da História.
Miguel Torga, in Diário
XIII
NÃO
É O MEU ESPELHO, EU VOTO
CDU
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