(desenhos de Lima de Freitas)
VAMOS ANDANDO…
Interiorizámos o sebastiânico nevoeiro, bruma que sempre nos envolveu a esperança e, assim, “vamos andando”. “Vamos andando…”, expressão do nosso dia a dia que retrata o ramerrão que nos oprime.
A vida é assim… Pois é, responde o outro, afogado na sua ronceirice.
E neste nosso fatal fatalismo, já nem vamos andando, deslizamos, escorregamos ao sabor da inércia. “O que é que se há-de fazer?...”
Somos assim ou desejam-nos deste modo? se assim fossemos, como justificar o desabrochar das nossas capacidades e o reafirmar da nossa personalidade quando, noutras paragens, somos chamados a pôr à prova os nossos méritos?
Afogamos a nossa auto-estima no “lá terá que ser”, quando não no desleixo que expressa o “quero lá saber” ou no enjoado, “pois, pois…”
Deixámos de assumir as convicções que nos restam; de ombros descaídos caminhamos para uma auto-castração que leva ao cinzentismo que desagua na neutralidade, lugar seguro que permite cair para a direita ou esquerda, conforme soprem os ventos, podendo, assim, mais facilmente, rejubilar por oportunismo ou vaidade com as vitórias dos clubes ou partidos que estejam na mó de cima. Exultam-se as virtudes alheias porque deixámos de acreditar em nós próprios.
Bons, valorosos, foram os nossos antepassados. Onde está o homem capaz de manejar a espada de D. Afonso Henriques? Onde?! Esse é que era destemido! E o Navegador? imponente em Sagres sonhando “O globo mundo em sua mão”, como nos diz Fernando Pessoa.
Pobres de nós, tão mesquinhos frente aos nossos “egrégios avós”!
Ninguém sabe onde pára a espada de D. Afonso, e nada nos permite crer que o Navegador tivesse estado em Sagres. Remetem-se, pois, os nossos feitos para um mítico passadismo, desvalorizando o presente.
No hoje que estamos vivendo, espezinha-se a inteligência colectiva, desvaloriza-se a criatividade, abafa-se tudo o que nos possa enaltecer para não termos a veleidade de assumir as nossas capacidades para intervir e fazer mudar o rumo da história, sabendo-se como se sabe, ou se deveria saber, que os grandes saltos históricos tiveram sempre o povo como seu principal intérprete. Um perigo!
Pretendem-nos um povo mendicante que estenda a mão e não levante o punho. Um povo que respeitosamente solicite e não se atreva a impor o lugar que lhe cabe na história. E porque a dependência é submissão fazem crer que o Estado lhes pertence e tudo o que dele obtemos é por bondade sua e não por direito próprio e inalienável.
Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz
Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações
Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!
Poema de José Gomes Ferreira
(música de Fernando Lopes Graça)
2 comentários:
Até os rebanhos hão-de acordar,nem que seja pela fome e miséria.
Um abraço,
mário
É no acordar que está o ganho...
Um abraço.
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