Roubei no fassebuke, mas sei que me
absolvem.
ManiFesta
Isto já vem do tempo das cavernas,
ou então não, que esses não seriam lá muito comunicativos, mas de certeza o
Cícero identificava-o como um mecanismo de retórica muito replicado. Consiste
em frisar que não se pretendia falar de determinada coisa, e até se guarda o papelinho
do discurso no bolso, para depois se ir directo a esse exacto assunto. E eu até
nem ia falar da Festa do Avante. E até nem sou das pessoas mais caucionadas
para o fazer. O meu contributo é mínimo e ridículo, comparado com as centenas
de pessoas que abdicam das férias, vindas de todo o país, fazem trabalhos
pesados, técnicos, artísticos e complexos, eu sei lá… dormem acampados, passam
frio e calor, e muitos cansaços (a verdade é que também se divertem imenso).
Portanto, eu que nem ia falar da Festa do Avante, eu que nunca falhei uma,
excepto as primeiras, porque não era lá muito portátil, mas se há coisa que
agradeço à minha mãe foi ter-me levado consigo em criança à Festa e as memórias
que guardo são tão fortes e vitais… E nem ia falar de como os estrangeiros e
visitantes pela primeira vez ficam abismados com aquela festa, com os duzentos
espectáculos, em 12 palcos com actuações em simultâneo, cento e tal
restaurantes, peças de teatro, cinema, exposições, debates tudo isto em três
dias… E de como os artistas ficam extasiados, não só com o público – o palco
principal abre para uma audiência de mais de 50 mil – mas também com as
excelentes condições técnicas. Ao ar livre, à-beira-Tejo… E ainda uma feira do
livro, outra do disco, um espaço maravilhoso para crianças, outro para
desportistas de várias modalidades… Uma segurança inexcedível, um corpo de
médicos e enfermeiros que se voluntariam e são irrepreensíveis… E depois cá
aparecem os tontos do costume, ou com os clichés já gastos e repisados, que repetem
uns dos outros, de uns anos para os outros, como se vivessem todos fechados no
mesmo centro de dia, tremelicantes de apatia e tédio, a olhar para a televisão
e a resmungar desvarios, e a gente já nem liga, e até se ri, porque em todo
lado há pessoas tontas que consomem preconceitos enlatados, com alguma
sofreguidão. Quem lá vai, sabe. Quem não vai, sabe o que os outros querem que
saiba. Só que depois há os tontos mal-intencionados. Que tentam enganar quem
gosta de ser enganado, induzir e instigar e maldizer. Tentar sequer sugerir que
na Festa do Avante existe censura ou qualquer tipo de comportamento segregador
é de tal maneira desonesto, que a gente já não se ri assim tanto. Estamos a
falar de um acontecimento único na Europa, que é para todos, velhos e novos,
pessoas com gostos e interesses diferentes. Que acarinha e promove a cultura, e
a alegria. É justamente isso que ela tem de tão belo e único. É uma das coisas
boas que sobreviveram do 25 de Abril, é uma das coisas boas que no nosso país
acontecem. É irrepetível. Nenhuma outra força política teria capacidade para
fazer sequer um décimo. Por isso, agachem-se ó vítimas do vosso cinzentismo,
famélicos do vosso sorumbático ressentimento.
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