O que não se mostra não existe
Juan Ignacio Zubiarrain
“Não
há discurso (análise científica, manifesto político, etc.) nem ação
(manifestação, greve, etc.) que, para ter acesso ao debate público, não deva
submeter-se a esta prova de seleção periodística, ou seja, a essa colossal
censura que os jornalistas exercem, sem se darem conta, ao não reterem mais do
que é capaz de os interessar de “captar a sua atenção” quer dizer, de fazer
parte dos seus interesses, dos seus esquemas mentais, e condenar à
insignificância ou à indiferença expressões simbólicas merecedoras de chegar a
todos os cidadãos” de Pierre Bourdieu no livro “Sobre a Televisão”.
(…)
Os media
generalistas têm evidentes laços visíveis e invisíveis com o poder, com o
estado, com a banca, com os protetores, com os políticos corruptos e não
corruptos, com empresas multinacionais, com capitais sórdidos, com capitais
enredados de acionistas que nem sempre se sabe de onde vêm.
E tudo se passa numa suposta harmonia
democrática, de liberdades ocidentais e cristãs, liberdades teatralizadas,
liberdades amordaçadas.
Um oligopólio mediático de quatro amigos que
dirigem todos os media com a anuência
cúmplice de jornalistas de faz-de-conta, da banca e do estado. Estão aí todos.
Encenando essa obra de ficção que se chama jornalismo livre e comprometido.
É dada prioridade ao anunciante e
narcotiza-se a audiência, vomitam-se as notícias e serializam-se as
entrevistas, em muitos casos mutiladas pela publicidade, condicionam-se as
conferências de imprensa, as perguntas e ainda o teatro político, alimentando
deste modo o aspeto franzino e enfermiço do ser humano. Vangloria-se a
importância de personagens que desfilam pelos estúdios (como representantes) já
não como jornalistas, mas quase porta-vozes de uma bancada de partido ou
tendência partidária ou mesmo lobistas de meios de comunicação disfarçados de
jornalistas. Envergonha ver como os responsáveis dos despedidos, dos
desalojados, de uma economia capitalista desregrada que alimenta e gera a usura
e a avareza, são os mesmos capitais que favorecem estes jornalistas de renome,
nesses programas de êxito que chegam aos nossos televisores, rádios e meios
gráficos.
Mudar tudo para que nada mude
A mudança nos media generalistas exige que lavem os seus trapos e a sua ética e
se renovem porque as suas programações cheiram a ranço, ou então investiguem ou
mudem o atual medíocre estado do que mitificamos como jornalismo responsável e
que todos sabemos que aí está, mas nos media
alternativos, universidades, em pessoas que exercem o jornalismo cidadão e
necessitam um canal através do qual possam canalizar os seus trabalhos de
investigação, suas denúncias. Mas por medo ao ridículo, numa sociedade de
cobardes e acomodatícia, torna-se difícil reconhecê-los e dar-lhes lugar no statu quo mediático. Difícil, se não
impossível, é pedir aos media
comerciais que se retratem da sua participação na sórdida cortina informativa
que nos mostraram nestes últimos anos e que seguem praticando. Disfarçam de
premissas o que todo o mundo já sabe, entrevistam personagens quer sejam
corruptas ou não e fazem-lhes sempre perguntas condescendentes sem abordar os
temas de fundo. O jornalismo das generalistas é insano, manipulador e procura
abranger audiências à custa da integridade ontológica, não pensam na informação,
mas só na conta dos resultados. Auto enaltecem as suas notícias, quando a
realidade é que, entre os compromissos comerciais e os favoritismos políticos,
só procuram posicionar-se comodamente nalgum recanto do arco político para
serem cobiçados e abrigados sob a esteira de qualquer financiamento.
Apostar no jornalismo cidadão oposto ao
jornalismo subordinado ao capital é a saída natural e necessária para dar
lugar aos invisíveis, aos ocultados, àqueles a quem não se dá voz e a uma
informação sã e direta. Por isso, o projeto de televisões, rádios e meios
comunitários e alternativos é a opção ao atual obscurantismo mediático.
Tradução de CS/LA
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