As duas
mulas
coxas
«Trata-se
de irmãos siameses
em litígio
porque
excessivamente
unidos»
Cadernos do
Cárcere –
António Gramsci
Com
ou
sem
razão esta
alimária, a
mula,
sempre foi e
continua a ser
muito
mal
conceituada,
não
pelos
burros, os
verdadeiros, esses
que estão
em
vias de
extinção. A
mula tem o
estigma da
manha e,
como se
não
bastassem os inúmeros epítetos
pejorativos
que
acumula ‘pessoa
reles,
fingida ou
matreira’,
significa também
doença
venérea e
correio de
droga,
mas
principalmente,
designa dissimulação
onde
reina a
hipocrisia.
As
estórias
que o
meu
amigo Elias
gosta de
contar
encaixam sempre no
que o cerca, e
embora a
sua
imaginação
me
espante, não se
cansa de afirmar
que a
ficção
nunca
conseguirá ultrapassar a
realidade.
O
entusiasmo
que põe na
narrativa das
suas “duas
mulas
coxas”
faz-me sorrir e
pensar;
sim,
porque
estórias
só
para
entreter e
que
não
nos façam
reflectir, não fazem
parte do
seu
reportório.
Com
um
sorriso
matreiro, o
meu
amigo Elias
dá, assim,
início à
sua
estória:
Era uma
vez uma
carroça
puxada a duas
mulas
coxas,
cada
qual atrelada a seu
varal,
mancando cada uma
para
seu
lado. A da
esquerda,
como
lhe
saltaram os cravos da
ferradura da
pata
direita, (os
outros
cravos
desde há
muito
que os
não
tinha),
claudicava para o
lado
direito, e a
do varal
contrário
simulava coxear
para a
esquerda
porque,
mula
que
era,
fingir
sabia.
E,
assim,
tropeço
aqui,
tem-te não caias acolá,
desaguisado aparente
frente às
câmaras de
televisão,
seguiam um
percurso comum
sem
interromper a
marcha. E
porque usavam
espessos
antolhos, escoiceavam às cegas
procurando atingir
quem as
apupasse.
Pedi
desculpa ao
narrador pela
interrupção,
mas
não
resisti em
lhe
perguntar o
que é
que
transportavam na carroça e a
quem se
destinava a carga, e
encostando-se a mula
sinistra
tanto à
direita
por
que
razão
não as
colocavam num só
varal
bem ao
centro?
Os
dois
varais
dissimulam a alternância. A
carga
mais
delicada
destina-se a garantir aos
Bancos
impostos
baixos e
salários de
miséria
para
quem
trabalha à
mistura
com muitas
promessas a
caminho do
esquecimento.
Como
carga
suplementar, podem
ser
vistos
enormes
sacos
repletos de
demagogia,
rolos de
desfaçatez
para
embrulhar os
menos
atentos e
discursos
enfadonhos,
repetindo a lengalenga
habitual.
As
mulas zurram
todas na mesma
frequência, só
diferem nos
decibéis.
ENTRETANTO HÁ QUEM LHES APERTE O FREIO.
1 comentário:
São mesmo duas mulas coxas ou irmãos siameses. Qualquer expressão se adapta bem a esses senhores.
Um abraço.
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