sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Eleitores e/ou masoquistas

São roubados, sabem por quem, e agradecem-lhes com o voto

A corrupção é um crime com dez milhões de vítimas, mas sem culpados poderosos.

"A corrupção é o lubrificante das engrenagens entre os interesses privados e os poderes públicos." A definição de Euclides Dâmaso, antigo procurador-geral distrital de Coimbra, ilustra o peso de um fenómeno social que leva ao "enfraquecimento do Estado de Direito e facilita a atuação do crime organizado", tão lesivo que a comunidade internacional acabará por classificá-lo como "crime contra a humanidade".



De “A corrupção em Portugal de A a Z por Francisco Teixeira da Mota”27 de Setembro de 2019 Público
  
O livro Corrupção – Breve história de um crime que nunca existiu, do jornalista Eduardo Dâmaso, dá-nos uma radiografia que chega a ser dolorosa.
“Contam-se pelos dedos de uma mão as situações em que a justiça foi eficaz com pessoas influentes, no sistema político ou nos negócios. A corrupção é um crime com dez milhões de vítimas em Portugal, mas sem culpados poderosos. É um crime invisível que, no limite de alguns discursos públicos sobre a matéria, nunca existiu verdadeiramente, pelo menos ao nível do poder de Estado. Nada mais enganador!”

“Glossário dos casos que foram abalando o regime que tem como primeira entrada “Aviões Airbus”, a que se segue “BPN” e termina com “Portucale”, sendo a penúltima entrada “Operação Furacão”.

Para o autor do livro, são cinco as “expressões mágicas” para compreender a corrupção no nosso país: “fundos comunitários, perdões fiscais, facturas falsas, obras públicas e prescrições judiciais”. É certo que é uma radiografia, às vezes, dolorosa: “(Durante três décadas) funcionava assim: faziam-se buscas para recolher informação, a documentação amontoava-se e os processos ficavam parados, por vezes uma década, na fase da investigação, acabando por prescrever. A Polícia Judiciária e o Ministério Público não dispunham de meios técnicos nem humanos, nem de leis apropriadas, e limitavam-se a desenvolver uma linha de investigação arqueológica, uma autópsia judicial.”

“O comportamento político de Portas na negociação dos submarinos é fortemente criticado no despacho de arquivamento do Ministério Público. Nomeadamente, a questão do preço, que, tendo sido decidido em Conselho de Ministros, não era final. E que, não sendo final, tinha o tal mecanismo contratual que previa uma actualização diária”; ou “No processo Face Oculta, ficou igualmente bem vincada para a história a já referida omissão da Justiça aos níveis mais elevados. Uma omissão que tem a assinatura do então procurador-geral da República, Pinto Monteiro, do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento. Pelo punho destes dois magistrados foi impedida, pura e simplesmente, a investigação do negócio PT/TVI, pelo qual passava a compra da TVI e o controlo da esmagadora maioria dos títulos da imprensa português. Sócrates queria ter tudo na mão”.
O BPN foi, também, o primeiro símbolo trágico da incapacidade de o Banco de Portugal de fazer uma verdadeira supervisão bancária que, pela fiscalização preventiva, evitasse desastres maiores, como os que vieram a verificar-se mais tarde com o BES e quase todo o sistema financeiro”; ou, mais à frente, quando Joe Berardo vai a uma comissão de inquérito do Parlamento gozar com os deputados e dizer que não tem dívidas (...), isso não é um episódio caricato. Berardo sabe que pode dizer o que quiser. O seu seguro de vida está nos segredos na cumplicidade, no que conhece sobre todos os outros – políticos, banqueiros, empresários – com quem partilhou a estratégia de ataque à Cimpor, à PT e, em particular, ao BCP, que deu início ao maior ciclo de politização da banca portuguesa de sempre, entre 2005 e 2011. Isso chama-se o poder da chantagem”.

Por último, nesta obra, cuja leitura naturalmente se recomenda, a aversão dos portugueses às maiorias absolutas encontra aqui uma explicação simples: “As maiorias absolutas de Cavaco Silva e de José Sócrates (...) são mesmo casos brutais, no que comportam de evidência sobre formas delinquentes de gestão do poder político.”

1 comentário:

Olinda disse...

Masoquistas?Não,são antes cúmplices,são desonestos também.Muitos dizem:"Se fosse eu fazia a mesma coisa".São os que defendem que os políticos são todos iguais.Abraço