A Festa do Avante! Chateia…
(Miguel Esteves Cardoso, in Revista Sábado,
13/09/2007)
(Este texto é um notável tesourinho. Não sei se hoje – 15 anos
passados -, com o atual ambiente inquisitorial de perseguição e ostracização ao
PCP, o MEC teria coragem de o escrever. Talvez. O MEC é muito
persistente nas suas idiossincrasias, para o bem ou para o mal. Em qualquer
caso é uma bofetada magnífica em todos os torquemadas encartados. Estátua de
Sal, 04/09/2022)
Dizem-se muitas mentiras acerca delas mas, por muito
que custe aos anticomunistas reconhecê-lo, são magníficas.
A Festa do Avante! é a maior
iniciativa político-cultural do país. Ela é, como se sabe, o resultado do
trabalho voluntário de milhares e milhares de militantes e simpatizantes
comunistas. A forma como é tratada pela comunicação social dominante é um
exemplo, dos mais evidentes, do silenciamento a que é submetida nos jornais,
revistas, rádios e televisões toda a actividade do PCP. Uma actividade que,
sublinhe-se, é maior do que a soma das actividades de todos os restantes
partidos.
Quando não é o silêncio, é a inverdade. Dizem-se
muitas mentiras acerca da Festa do Avante!: que é irrelevante; que
é um anacronismo; que é decadente; que é um grande negócio disfarçado de festa;
que já perdeu o conteúdo político; que hoje é só comes e bebes.
As festas do Avante!, por muito que custe
aos anticomunistas reconhecê-lo, são magníficas. É espantoso ver o que se
alcança com um bocadinho de colaboração. Não só no sentido verdadeiro, de
trabalhar com os outros, como no nobre, que é trabalhar de graça. Mas não basta
trabalhar: também é preciso querer mudar o mundo. E querer, só por si, não
chega. É preciso ter a certeza que se vai mudá-lo. Por isso o conceito do PCP
de “colectivo partidário” parece provocar indisposições a muito comentador de
serviço.
Porque os comunistas não se limitam a acreditar que a
história lhes dará razão: acreditam que são a razão da própria história. É por
isso que não podem parar; que aguentam todas as derrotas e todos os revezes;
que são dotados de uma avassaladora e paradoxalmente energética paciência;
porque acreditam que são a última barreira entre a civilização e a selvajaria.
Por isso sobre a construção da festa cai um silêncio ensurdecedor.
Não há psicologias de multidões para ninguém: são mais
que muitos, mas cada um está na sua. Isto é muito importante. Ninguém ali está
a ser levado ou foi trazido ou está só por estar. Nada é forçado. Não há
chamarizes nem compulsões. Vale tudo, até o aborrecimento. Ou seja: é o
contrário do que se pensa quando se pensa num comício ou numa festa
obrigatória. Muito menos comunista. Todos os portugueses haviam de ir de cinco
em cinco anos a uma Festa do Avante!, só para enxotar estereótipos
e baralhar ideias. Por isso, a festa é um “perigo” que há que exterminar.
Assim se chega a outro preconceito conveniente. Dava
jeito que a festa do PCP fosse partidária, sectária e ideologicamente
estrangeirada. Na verdade, não podia ser mais portuguesa e saudavelmente
nacionalista. Sem a orientação e o financiamento de Moscovo, o PCP deveria ter
também fenecido e finado. Mas não: ei-lo. Grande chatice.
A teimosia comunista é culturalmente valiosa porque é
a nossa própria cultura que é teimosa. A diferença às modas e às tendências dos
comunistas não é uma atitude: é um dos resultados daquela persistência dos
nossos hábitos. Não é uma defesa ideológica: é uma prática que reforça e
eterniza só por ser praticada.
Enquanto os outros partidos puxam dos bolsos para
oferecer concertos de borla, a que assistem apenas familiares e transeuntes, a
Festa do Avante! enche-se de entusiásticos pagadores de bilhetes.
E porquê? Porque é a festa de todos eles. Eles não só
querem lá estar como gostam de lá estar. Não há a distinção entre “nós”
dirigentes e “eles” militantes, que impera nos outros partidos. Há um
tu-cá-tu-lá quase de festa de finalistas. Por isso, ao programa da festa,
anunciado em conferências de imprensa, é concedido meia dúzia de linhas ou de
segundos.
Ser-se comunista é uma coisa inteira e não se pode
estar a partir aos bocados. A força dos comunistas não é o sonho nem a saudade:
é o dia-a- dia; é o trabalho; é o ir fazendo; e resistindo, nas festas como nas
lutas. Por isso a dimensão e o êxito da festa chateiam. Põem em causa as
desculpas correntes da apatia.
1 comentário:
Uma crónica memorável.Lembro-me que a publiquei no FB e foi viral,chegou a centenas de pessoas pela multiplicação de partilhas.O tempo passa e,cada vez mais,assiste-se ao ataque cobarde de quem só tem a agressividade e,vamos lá,a "dor de cotovelo"de a Festa do Avante ser um acontecimento impar e demonstrativo de vida e força do PCP.Abraço
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