quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Ode ao vigarista

 Ana Margarida de Carvalho

Ode ao vigarista

Os vigaristas são admiráveis. Têm o engenho da ludibriação, mexem os cordelinhos do embuste, são muito talentosos no endrominanço, dominam as manhas e as patranhas. Os vigaristas são prodigiosos impostores. Fascinam como quem finca o dente. Corrompem como quem seduz. E já vão pondo o pé na entrada da porta. Os vigaristas burlam com um sorriso. Os vigaristas são geniais. E, normalmente, andam aos pares, ou trios, farejam-se, associam-se, reconhecem-se, riem-se das mesmas graças, rasteiraram velhinhas, devem topar-se pelo olhar enviesado e dissimulado, de quem está prestes a cometer mais uma carambola. E depois piscam o olho uns aos outros, bojudos de satisfação. Os vigaristas têm uma sede insaciável de dinheiro, perseguem-lhe o rasto, com a avidez das erínias antigas que seguiam os trilhos de sangue, de cabelos entrançados de serpentes. Os vigaristas alimentam-se de poder, viciam-se nas suas próprias vigarices, protegem quem lhes beija a mão e trepam por esquemas e mais esquemas como se fossem socalcos para chegaram lá acima ao pedestal. Os vigaristas querem tapetes vermelhos, os vigaristas querem lisonjas, cortes e reconhecimento pelo que não fizeram, justamente por não o terem feito. Os vigaristas precisam do poder para compensarem o que não são e para ocultarem o que são. Os vigaristas não conseguem parar. Nunca se saciam. Os vigaristas resolvem os seus assuntos com calma, calma, sem precipitações. Os vigaristas têm síndroma de abstinência quando não lhes dão a oportunidade do próximo golpe. Os vigaristas agonizam se lhes estragam os planos. Porque há sempre uma tramóia que ainda podem cometer, mais um logro que está ao seu alcance. Os vigaristas têm um sono profundo, não sentem remorsos, nem pesos na consciência. Os vigaristas precisam de ajuda, coitados. Gostam de si, acima de tudo e todos, ufanos dos seus trambiques. O espelho é a sua maior recompensa. Nada os trava, nem a memória de um filho que já veio doente, condenado à nascença a morrer cedo demais.

Ana Margarida de Carvalho
(do facebook – Lisboa 15 de dezembro de 2017)


NOTA; PREPAREM-SE PARA O DIA 20/11/2019, HÁ FESTA!

 ATÉ LÁ DIGO ONDE E PORQUÊ

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