terça-feira, 25 de novembro de 2008

A morte dos três chineses -- autocolante/19



“As palavras são como doses minúsculas de veneno que podemos engolir sem darmos conta.
Vicente Romano in Intoxicação Linguística


Os telejornais deram-nos o privilégio de sermos informados de um acidente que vitimou três cidadãos chineses, privilégio que provavelmente não tiveram os seus concidadãos; quando morre um chinês, ou mesmo três, nem todos os outros são informados. Mas nós, sim!

Nesse mesmo dia trabalhadores portugueses teriam dado entrada nos hospitais devido a acidentes de trabalho, alguns vão ficar impossibilitados de fazer uma vida normal durante o resto dos seus dias, ou não resistindo a ferimentos encontram a morte que não constará nas estatísticas. Todas as semanas morrem mulheres vítimas de maus-tratos, e para que morram devido a agressões, quantas centenas não serão agredidas diariamente. Mas tudo isto vem fazendo parte da rotina deixando, obviamente, de interessar às redacções dos media, nomeadamente os ditos e referência.

Mesmo contando com a omertà, código de silêncio, o BPN vai continuar a ser notícia este fim-de-semana. Desconhece-se se o detido é o Padrinho ou, como acontece normalmente, não passa da parte visível do iceberg. As ramificações entrelaçam-se, de tal modo, que é difícil encontrar a ponta da meada. Os vários gangs entram em choque ao levantar ligeiramente o véu das conivências e, assim, exercendo veladas chantagens. O Menezes do Norte afirmou que foi ameaçado por ex-ministros ao tentar abrir o saco podre, deixando um amplo espectro de ex-ministros sob suspeita. O Loureiro é desmentido pelo ex-vice-governador e pelo próprio governador do Banco de Portugal e o Partido Socialista começou por recusar ouvir o ex-ministro de Cavaco Silva e Conselheiro de Estado por ele proposto que, por sua vez, sem que aparentemente nada o justifique, vem dizer, que para aí não pôs prego nem estopa; esse mesmo ex-ministro que apresentou a biografia de Sócrates, seu menino de oiro, a quem teceu os maiores encómios.

Prevê-se, pois, como irão estar ocupados os nossos meios de comunicação social, não contando já com a hipótese de neste mesmo fim-de-semana falecerem mais meia dúzia de chineses ou, como está previsto, estoirar outro banco onde só funcionam as grandes fortunas.
Os denominados congressos, decididos e organizados em poucas semanas, esse folclore político onde barões desavindos se agridem verbal e fisicamente e de onde tem emergido a fina-flor da máfia que está a ser investigada, têm tido uma cobertura total e em directo, nomeadamente da rádio e da televisão.

O Congresso do Partido Comunista Português que levou um ano a preparar e em que se discutiu “o Projecto de Resolução Política”, cerca de cem páginas A4, está a realizar-se neste momento no Campo Pequeno com a participação de centenas de delegados e milhares de convidados; aqui serão analisadas as questões mais pertinentes da nossa vida colectiva e, como não se prevêem insultos nem fofocas, será relegado para as páginas menos nobres dos jornais e na televisão não terá mais que dez por cento do tempo concedido aos mercenários portugueses, assassinos profissionais, que se especializam em Israel.

“Entre os jornalistas, embora sejam raros, podem existir casos de ingenuidade profissional, mas em informação nada há que seja inócuo”.

NADA!

Cid Simões
fcidsimoes@sapo.pt
(crónica lida na Rádio Baía também on-line)

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