quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

OS CHARLATÃES


A BANHA DA COBRA
Num cesto transporta a cobra. Se há cobra, a “banha” é forçosamente de confiança, proveniente de réptil certificado pela ASAE, confirmação incontestável do produto. Cobra tão necessária ao charlatão, como a todos os que duvidando da aceitação do seu discurso, apontam para a companheira e exclamam: “Está aqui a minha mulher que me não deixa mentir.” E a pobre, não diz que sim nem que não, limita-se a sorrir. Ai dela!
O rapaz de dentes sujos, e o homem de perna encolhida que depois de besuntada fica mais comprida, fazem parte da bagagem.
Juntar à tralha para o espectáculo a descontracção necessária a todo o embusteiro: fluente, afirmativo, sorridente, em suma, o perfil de aparente credibilidade colada a um pantomineiro, tal como modernamente especialistas de imagem são exímios em fabricar. Embora muitos governantes nem para isso tenham jeito.
Na ponta de um cordel caminhava um rafeiro, (o bonito), “Um pobre cão vadio, que não tinha coleira e não pagava impostocomo diria o velho Guerra Junqueiro. Era uma novidade neste tipo de espectáculo, mas como o lanzudo não parava de se coçar, ficava a dúvida se não seria unicamente o transporte das pulgas.
O “artista” enrolou a cobra ao pescoço, arregaçou as mangas, fez soar a pandeireta e como qualquer ministro, Presidente ou banqueiro atrevido, afirmou a plenos pulmões:

Não vim aqui para enganar ninguém!
E para dar credibilidade à afirmação e marcar as diferenças, começou por afirmar:
Movimento-me livremente por todas as ruas e vielas, não tenho guarda-costas e canto a Grândola Vila Morena porque me enche a alma.
O meu nome não anda arrastado pela lama nem a apodrecer em tribunais. Cumpro as minhas obrigações para com o fisco a Segurança Social e pago os meus impostos directos no para o cão das minhas pulgas e no casqueiro de que me nutro.
Não estamos aqui para enganar ninguém!
 
E continua ainda com mais vigor: “Sou um homem honesto”. E virando os bolsos do avesso, exclamava:
Podem confiar em mim e no “bonito”, não estamos aqui para enganar ninguém, não vivo na Casa da Coelha, Cabo Verde, nem estudo filosofia em Paris.
A multinacional farmacêutica Suiça prometeu-me um lugar de presidente se lhe desvendasse a formula da minha banha da cobra, mostrando-me que tinham dado emprego a um ex-primeiro-ministro muito mais aldrabão do que eu.
Respondi-lhes simplesmente que eu sou um aldrabão honesto, e a conversa ficou por aqui.
O cão sacudiu-se, e face à negação de um futuro tão promissor, as pulgas hesitaram se haviam de mudar de cão. Há pulgas que saltitam de cão para cão consoante as conveniências.
O homem parou de tocar a pandeireta, abriu a camisa, voltou-se para o público, e, teatral, convidou ainda: “Procurem à vontade; nada tenho a esconder”! “Os milhões do BPN não passaram por aqui, nem encontram vestígios de submarinos ou de outras grandes burlas. Nós, eu e o “bonito”, não roubamos nada a ninguém.
A cobra dava sinais de cansaço. As cobras não apreciam o rastejar humano. E o homem terminou: “A mim todos me conhecem, sou oficialmente um charlatão, e o meubonito” a minha cobra, o deleite das crianças, somos estimados pelo povo.
Fez uma vénia de despedida e agradecimento, e circunspecto alertou:
Cuidado com a concorrência!Presidentes, Ministros, banqueiros e conselheiros-embusteiros.
Olho neles! São piores que as víboras.

3 comentários:

trepadeira disse...

Tão bem retratados.
É sempre uma delícia ler-te.

Abraço,

mário

Graciete Rietsch disse...

Autênticos vendedores de banha da cobra venenosa, com a diferença de que esses andam a tentar ganhar a vida e estes andam a destruir a vida de um POVO.

Um beijo.

Olinda disse...

Eles vendem a banha,a cobra,o bonito,as pulgas,a mae que os pariu e tudo o que dë dinheiro.Sao porreiros,pâ!...