18 de Março de 1871, o
povo de Paris em armas deu início à primeira revolução proletária do mundo e
instaurou o primeiro governo da classe operária sob a palavra de ordem:
«Viva a Comuna!».
O susto foi tão grande que, ainda hoje, só o facto de se pronunciar o vocábulo
“comuna” causa um profundo mal-estar aos açougueiros que governam o mundo.
Razão para divulgar este decreto de 1871 e aproveitar para nos afirmarmos
nas lutas a travar.
Artigo I. As velhas autoridades de tutela, criadas para oprimir o povo de Paris, são
abolidas, tais como: comando da polícia, governo civil, câmaras e conselho
municipal. E as suas múltiplas ramificações: comissariados, esquadras, juízes
de paz, tribunais etc. são igualmente dissolvidas.
Artigo II. A comuna proclama que dois princípios governarão os assuntos municipais:
a gestão popular de todos os meios de vida colectiva; a gratuidade de tudo o
que é necessário e de todos os serviços públicos.
Artigo III. O poder será exercido pelos conselhos de bairro eleitos. São eleitores e
elegíveis para estes conselhos de bairro todas as pessoas que nele habitem e
que tenham mais de 16 anos de idade.
Artigo IV. Sobre o problema da habitação, tomam-se as seguintes medidas: expropriação
geral dos solos e sua colocação à disposição comum; requisição das residências
secundárias e dos apartamentos ocupados parcialmente; são proibidas as
profissões de promotores, agentes de imóveis e outros exploradores da miséria
geral; os serviços populares de habitação trabalharão com a finalidade de
restituir verdadeiramente à população parisiense o carácter trabalhador e
popular.
Artigo V. Sobre os transportes, tomam-se as seguintes medidas: os autocarros, os comboios
suburbanos e outros meios de transporte público são gratuitos e de livre
utilização; o uso de veículos particulares é proibido em toda a zona
parisiense, com excepção dos veículos de bombeiros, ambulâncias e de serviço à
domicílio; a Comuna põe à disposição dos habitantes de Paris um milhão de
bicicletas cuja utilização é livre, mas não poderão sair da zona parisiense e
de seus arredores.
Artigo VI. Sobre os serviços sociais, tomam-se as seguintes medidas: todos os
serviços ficam sob controle das juntas populares de bairro e serão geridos em
condições paritárias pelos habitantes de bairro e os trabalhadores destes
serviços; as visitas médicas, consultas e assistência médica e medicamentos
serão gratuitos.
Artigo VII. A Comuna proclama a amnistia geral e a abolição da pena de morte e declara
que a sua acção se baseia nos seguintes princípios: dissolução da polícia
municipal, dita polícia parisiense; dissolução dos tribunais e tribunais
superiores; transformação do Palácio da Justiça, situado no centro da cidade,
num vasto recinto de atracção e de divertimento para crianças de todas as
idades; em cada bairro de Paris é criada uma milícia popular composta por todos
os cidadãos, homens e mulheres, de idade superior a 15 anos e inferior a 60
anos, que habitem o bairro; são abolidos todos os casos de delitos de opinião,
de imprensa e as diversas formas de censura: política, moral, religiosa etc;
Paris é proclamada terra de asilo e aberta a todos os revolucionários
estrangeiros, expulsos [de suas terras] pelas suas ideias e acções.
Artigo VIII. Sobre o urbanismo de Paris e arredores, consideravelmente simplificado
pelas medidas precedentes, tomam-se as seguintes decisões: proibição de todas
as operações de destruição de Paris: vias rápidas, parques subterrâneos etc;
criação de serviços populares encarregados de embelezar a cidade, fazendo e
mantendo canteiros de flores em todos os locais onde a estupidez levou à
solidão, à desolação e ao inabitável; o uso doméstico (não industrial nem
comercial) da água, da eletricidade e do telefone é assegurado gratuitamente em
cada domicílio; os contadores são suprimidos e os empregados são colocados em
atividades mais úteis.
Artigo IX. Sobre a produção, a Comuna proclama que: todas as empresas privadas
(fábricas, grandes armazéns) são expropriadas e os seus bens entregues à
colectividade; os trabalhadores que exercem tarefas predominantemente
intelectuais (direção, gestão, planificação, investigação etc.) periodicamente
serão obrigados a desempenhar tarefas manuais; todas as unidades de produção
são administradas pelos trabalhadores em geral e diretamente pelos
trabalhadores da empresa, em relação à organização do trabalho e distribuição
de tarefas; fica abolida a organização hierárquica da produção; as diferentes
categorias de trabalhadores devem desaparecer e desenvolver-se a rotatividade
dos cargos de trabalho; a nova organização da produção tenderá a assegurar a
gratuidade máxima de tudo o que é necessário e diminuir o tempo de trabalho.
Devem-se combater os gastadores e parasitas. Desde já são suprimidas as funções
de contramestre, cronometrista e supervisor.
Artigo X. Os trabalhadores com mais de 55 anos que desejem reduzir ou suspender sua
atividade profissional têm direito a receber integralmente os seus meios de
existência. Este limite de idade será menor em relação a trabalhos
particularmente custosos.
Artigo XI. É abolida a escola “velha”. As crianças devem sentir-se como em sua casa, aberta
para a cidade e para a vida. A sua única função é a de torná-las felizes e
criadoras. As crianças decidem a sua arquitetura, o seu horário de trabalho e o
que desejam aprender. O professor antigo deixa de existir: ninguém fica com o
monopólio da educação, pois ela já não é concebida como transmissão do saber
livresco, mas como transmissão das capacidades profissionais de cada um.
Artigo XII. A submissão das crianças e da mulher à autoridade do pai, que prepara a
submissão de cada um à autoridade do chefe, é declarada morta. O casal
constitui-se livremente com o único fim de buscar o prazer comum. A Comuna
proclama a liberdade de nascimento: o direito de informação sexual desde a
infância, o direito do aborto, o direito à anti-concepção. As crianças deixam
de ser propriedades de seus pais. Passam a viver em conjunto na sua casa (a
Escola) e dirigem sua própria vida.
Artigo XIII. A Comuna decreta: todos os bens de consumo, cuja produção em massa possa
ser realizada imediatamente, são distribuídos gratuitamente; são postos à
disposição de todos nos mercados da Comuna.
Extraído da Introdução do livro Escritos sobre a Comuna de Paris
Seleção e tradução de Osvaldo
Coggiola (professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo e
militante no Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior – Sindicato
Nacional, ANDES-SN
1 comentário:
È admirável a actividade legislativa da Comuna.Em semanas introduziu mais reformas,que nos dois séculos anteriores.Abraço
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