Semiótica da Televisão
As armadilhas da "representação"
televisionada
Nos modos de produção de “sentido”
televisual, o problema do seu caráter representativo ou participativo tem também muita influência. Ao já de
si odioso modelo de gestão dos “tempos televisivos” afogado pelo império da
publicidade e do fundamentalismo de mercado, há que juntar o modelo intermediarista que a televisão comercial tomou como
seu para nos impor o seu discurso, os seus gostos, os seus valores e dejeções
ideológicas. Uma verdadeira calamidade.
A única
coisa que pretendem é impor-nos alguém ou algo que “explica” tudo, com os seus
meios e modos, a seu bel-prazer e conveniência. Leem-nos as notícias por eles
seleccionadas e que dizem (com exagerado ênfase) ser “o mais importante”. Dizem
o que devemos comprar, a que preço, com que “virtudes” e à custa de que
condições. A crédito ou a pronto. Dizem-nos quem e o que é “belo”, “sedutor”,
“sensual”, “atrativo”, “elegante” ou de ”sucesso”… impõem-nos os seus prazos e
ritmos. Manipulam-nos o dicionário, o vestuário, o imaginário e o relógio. Em
tempo real.
Há sempre um explicador para tudo, vendedor ou condutor…
empenhado em ser o simpático, o eficiente, o esclarecido ou o iluminado.
Disposto a levar-nos ao paraíso dos seus interesses políticos, ideológicos e
comerciais. Principalmente comerciais. A televisão mercantil é uma máquina de
guerra ideológica cravejada de intermediários que a tempo inteiro estão prontos
para nos esvaziar a cabeça de qualquer ideia, de toda a possibilidade e
oportunidade de participação autónoma. Há sempre alguém que conta anedotas por
nós, há sempre alguém que canta canções por nós, que dança, que informa, que
cozinha, que “sabe”, que “entende”, que “diz”, que “sorri”, que “saúda”… por
nós e sem a nossa autorização ou prévio acordo. É o “mundo” deles que dizem
“representar-nos”. E nós pagamos.
Os mais
“espertos” apercebem-se da sua ditadura na representação e nos fingimentos e
sabem assumir a forma de ”participação” que lhes convier, usando as pessoas
como decoração, como meros figurantes de ocasião em encenações “democráticas”
ou “populares”, quando tal lhes dá jeito. Dizem que “o público opina”,
“participa” quando eles dizem, como eles dizem, até o que eles decidem. Democracia
cronometrada. Não poucas televisões públicas estão infetadas com este veneno
ideológico televisivo “representativo” que cansa, que dói, que ofende e humilha
os povos “de todas as cores e latitudes”.
Não temos
uma verdadeira Televisão Participativa. Salvo casos incipientes e dolorosamente
incompreendidos, como a VIVE TV da Venezuela – no seu início – algumas
televisões comunitárias que se conseguem salvar de intermediários parasitas de
todo o tipo (igrejas, ONGs, partidos políticos oportunistas, Messias…) A
Televisão Participativa, como Democracia Participativa, está por construir. É
necessário muito trabalho e muita atenção crítica para eliminar das nossas
cabeças (e das estações televisivas que os povos dirijam) o perigo de repetir o
discurso burguês, o discurso do patrão nos écrans. Como se fosse nosso. São
necessárias agudeza e experiência, desconfiança prática e vigilância
científica, para não ser vítima da inoculação ideológica que nos representa como lhes convém.
A luta de classes também se expressa
nos écrans. Não nos vamos cansar de insistir na urgência de
romper com os modelos burgueses de comunicação, aproveitando criticamente só
aquilo que seja aproveitável (fundamentalmente tecnológico) e rejeitando tudo o
que de mais odioso tem um modelo de “produção de sentido” em Televisão,
especializada como ela está em apagar dos olhos dos povos os próprios povos e
em criminalizar os líderes sociais e as lutas sociais que desenvolvem esforços
inimagináveis de participação na criação de um mundo novo, justo, sem guerras,
sem fomes, sem classes e à vista de todos. Acabemos com a propriedade privada
da televisão e com os monopólios. Uma Televisão Participativa é possível, é
necessária e urgente.
Fernando Buen Abad
Tradução
CS/APS
1 comentário:
Que verdades!...As armadilhas são para os incautos,pois nem toda a gente "vai no bote".Abraço
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