GLOSSÁRIO ATUALIZADO
“E quando os vejo continuar no officio
illesos, não posso deixar de o atribuir à destreza de sua arte, que os livra
até da justiça mais vigilante, deslumbrando-a por mil modos, ou obrigando-a que
os largue, e os tolere; porque até para isso têm os ladrões arte.”
“Arte de Furtar” (1742)
Abafação é furto, abafador o ladrão e abafar a acção. Abarbatar e abotoar-se é deitar
mão do alheio
e, em calão,
o achatar, assim
como
afiançar, é simplesmente
roubar. Afanar é já da gíria - e é giro.
Enquanto o agadanhador surripia, agadanhar é lançar o gadanho, tirar à força, tal como agafanhar.
Alapardar
é apossar-se do que pertence
a outrem ou
seja locupletar-se ilegalmente. O alcance tem
nobreza, é mais para
pessoa fina, não tem a ver com a plebe, pela delicadeza do termo, não está
longe da alicantina, cheia de astúcia e manha.
Aliviar é
coisa de carteirista. Também
sinónimo de roubo, anexar é termo
abrangente, mais próximo
do apoderar-se, apossar-se, apropriar-se, mas apanhar alguém
com a boca
na botija, sendo também
roubar, é termo
frouxo. Arrancar, arrebanhar, arrebatar, arrepanhar são palavras fortes,
principalmente quando
colocadas ao lado do assenhorear-se, expressão
delicada, punhos
de renda, com
classe.
Barrela, significa engano,
logro, esparrela. Bater a carteira é roubar às ocultas a carteira
do bolso de outrem,
mas, só Bater é, no
Brasil, o nosso aliviar,
tal como
buscar tem o busco como autor. Ao bifar, furta-se disfarçadamente. O borlão, borlador ou burlista exerce a arte
de burlar, obviamente. Mas
deitar a mão
a… é benzer.
Ao
capiangar, furta-se com destreza,
sendo o capiango um ladrão astuto,
já o cafunge e o camafouje são gatunos, gente vil. Captar, faz-se com astúcia. Cardanho ou cardar é roubo na área do palmar, mas catar e catrafilar fazem
parte do jargão do choro, larápio
sem estatuto. Comer é espoliar,
saquear, e consumir iludir e comedeira refere-se a lucro
desonesto muito
próxima de exacção. O palavrão, concussão,
é específico para o funcionalismo público, uma honra. Corte é roubo, acção de cortar-se
ou apropriar-se de coisa alheia. E para terminar a terceira letra do alfabeto,
ficamos com cresta e crestar que se aplicam ao desfalque e
ao despojar.
Dar a palmada ou dar o golpe circulam na gíria
colorida do gingão e, claro que, deitar a luva ou deitar a unha
não são
expressões de salão,
assim como
depenar e depenador
também não.
Defraudador e defraudar são mais suaves no burlar. Porém, depredação e depredar são o roubo violento, muito
diferentes do desapossar é tirar e descaminho, um termo bonitinho,
próximo do desvio
e não longe
do desfalque
ou desfalcar, despojo ou despojar. Mas nobre, nobre mesmo, é o desvio…o desviar, não se utilizam abaixo do milhar e, creio que com a inflação, já
deviam ter sido promovidos a milhão.
Dolo, até pela pronúncia tem classe e
pavoneia-se pelos corredores
dos tribunais.
Empochar, empalmar,
empalmação andam muito
pelas ruas do calão
e eliminar, tal
como endrominar, também. Empolgar é mais violento e
o engodar
tem ardil. Esbrugar ou esburgar é forçar e esbulho e esbulhar são mais
abrangentes, vão até
ao abuso de poder;
já escamotear é roubar
com muita
habilidade e escorchar anda pelos mesmos becos do
despojar. Escroque, galicismo,
entrou no nosso linguajar
e ficou como burlão, intrujão,
vigarista e trapaceiro
que é. Ao esgueirar-se, subtrai-se com
astúcia, desvia-se, sendo a estafa burla; espoliar é extorquir e esquivar-se furtar; estelionato e o estelionatário tão em voga; subtrair herança é expilar. Extorquir, extorsão e extorsionário são
termos rudes;
já, extravio navega nas águas do desvio,
não fere as almas
sensíveis.
Fajardo furta
habilmente, faz fajardice em suma; falcatrua e
falsificar
andam muito a par;
a malta diz fanar, fazer a folha e fangueirada é furto
que vale a pena. Fazer, fezada, fazer rajá é simplesmente
roubar, mas
fazer a pala
é encobrir o roubo; e ainda com o verbo fazer temos o fazer mão
baixa e fazer mão de gato.
Filho
da noite é gatuno violento
assassino que
opera na calada da noite.
O flibusteiro
vive de expedientes, da trapaça;
forjar é falsificar; fraude ou
fraudulência, fraudar, fraudador andam no campo do engano,
do defraudar já
citado. Furto, furtar e furtança são linhas
do mesmo novelo,
onde se enrola a trapaça.
A avidez do galfarro
não perdoa, deita a mão ou o gadanho;
gadanhar ou
gadunhar são
artes do gamanço dos que sabem gamar. Gatázio é grande
logro e deita-se o gatázio a alguém ou a alguma coisa. Gatear é roubar já o gateador é ladrão
manhoso e gato, dar
gato por
lebre, fala-nos de logro.
Gatuno
é termo corrente
e gatunice a sua
prática; levar vida de gatuno
é gatunar, tal
como gatunagem é o colectivo
destes meliantes. Gaturama ou
gaturamo
não faz mais
que gaturar ou
gaturrar. No Brasil, guinda é roubo com
escalada, e, para nós, ao guindar rouba-se carteira
e também, em
calão, guindo é simplesmente roubo. Intrujão ou entrujão é o que
faz intrujice
e, ao intrujar, burla-se. Intrusão é usurpação, posse ilegal e violenta,
acção de se apossar de um
cargo, de uma dignidade…
o dia-a-dia em
suma.
E assim chegamos ao trivialíssimo: LADRÃO! Que no feminino nos dá a ladra, ladrona ou mesmo ladroa. O ladranete é o ladrãozinho de meia-tigela; ladripar é surripiar coisa de pouco valor, trabalho do ladripo ou do desclassificado ladranete, já mencionado, assim como do ladrisco, um tanto tolerado, vejam bem! Na gíria do Porto ladrilho é simplesmente gatuno. E sendo ladro, ladrão, ladroar a acção, e ladroagem seu vício, ou bando de ladrões, ladroado é o roubado. Defesa contra o ladroísmo eleitoral vem a propósito, é mais que ladroeira ou ladroíce, ladroísmo é um hábito, um vício dos que, ao ladroeirar, vão fazendo as suas ladroeiras. Temos, por fim, o ladranzana, ladravaz, ladravão ou ladroaço, palavrões aplicados aos grandes ladrões, não àqueles que desviam milhões, não: por uma questão de pudor, estilo ou conivência, o vocábulo não se lhes aplica. Sua excelência senhor fulano de tal ladranzana, ladravaz ou ladravão! Convenhamos que temos que encontrar palavras para esses crápulas. Lança: furto rápido. O larápio, ao larapiar ou larapinar, faz larapice; não é violento como o que, ao latrocinar, comete o latrocínio, roubo violento, mesmo à mão armada. Leilão é roubo no Dicionário de Calão. Levar, libertar e limpar vivem nas margens do jargão; faz-se limpeza ou livrar a alguém o que lhe pertence. Ao lograr pratica-se o logro a que nos sujeitam diariamente.
Dos jogos
malabares, que na sociedade
tanto se praticam, o gingão, muito a propósito, emprega malabar
como roubar,
e o malandro, que
também pode ser
gatuno, tem como
diminutivos malandrete, malandrim ou malandrote e seus
hierárquicos superiores o malandraço ou
malandrão. Ao malversar, fazem-se desvios abusivos. Mamata é roubo
de alto nível
e marmelada negócio
inescrupuloso; e meliante, gatuno; malversação
apropriação indébita de fundos, valores, esp. durante
administração de património alheio, público ou privado. Em calão, mordido é o roubado. Mosco é furto
em residência
com chave falsa,
furto audacioso,
com assalto;
já meter a unha é extorquir,
meter a mão,
roubar.
Ocultar é sonegar rendimentos… cometendo fraude. Onzenar é praticar usura, e onzeneiro o seu
autor.
Palmar é bifar; palmanço, gamar
e dar a palmada
tem a mesma raiz.
O pandilheiro faz parte da
pandilha ou quadrilha
de ladrões. O pantomineiro, mestre em histórias para enganar, exerce a pantomina e, com
as suas pantominices, acaba por levar à certa,
com inteligência,
a vítima escolhida. Para
o populacho, picar é roubar,
e pichelingue o larápio.
Ao pifar,
furta-se. Pilhar
tem extremos, vai do reles pilha-galinhas
à pilhagem
praticada, geralmente por um grupo, de forma
devastadora; mas pilha é o larápio e pilho ou pilhante
o gatuno ou
patife. E chegámos ao pirata, ladrão
ou ladra
do mar e não
só, sujeitos
que estamos a piratices, piratada, piratar, piratagem e a todas as piratarias que se nos
colam como sanguessugas, indivíduos que por meio de exacções tiram dinheiro
a outrem. Plágio ou plagiar é usurpar
as ideias ou palavras
de outrem, roubo
literário; plagiato acção de apresentar como seu o que se copiou e o plagiador ou plagiário
andam nos bicos
dos pés com
suor alheio.
Prear é
apossar-se de (alguém ou alguma coisa) ou pilhar, se a frase o consentir. Prender também pode entrar na área do suborno: suborno que se tornou
num vocábulo que
se traz na lapela, símbolo
de sucesso, promoção
social et cetera e tal.
Prescrever, prescrição
são as alavancas
que emperram a engrenagem
judicial em
benefício, geralmente,
dos colarinhos brancos
que desviam grandes
somas; manigâncias! A responsabilidade da sua
inclusão neste glossário
é minha, tal
como privatizar cuja
raiz é comum
a Privar que mais não é que tirar ou despojar. pungueia; batedor de carteiras, ladrão, punguista
pratica punga
('furto'); furtar das pessoas (dinheiro, carteira, relógio, jóias etc.), ger.
em locais de aglomeração.
Quadrilha é bando de malfeitores, subordinados
a um chefe que por vezes até pode
legislar, privatizar e forçar as prescrições. Bem entendido que o
quadrilheiro é o que faz parte
da quadrilha.
Rapace o que rouba, que rapina, e rapacidade
a inclinação para
tal mister. Rapar é
apropriar-se dos bens de outrem, deixando-o sem
nada. Rapina roubo
violento, pilhagem
e rapinação roubo
ardiloso; e da mesma
raiz seguem rapinador, rapinagem, rapinice, rapinanço, rapinante
e rapinar. Rapto
também é acto de furtar
e raptar
pode significar tirar
alguma coisa a alguém,
usando a força. E não
podia faltar o rato-de-sacristia,
beato falso
e ladrão de igrejas,
vai dar ao mesmo.
Se o ratoneiro é pessoa
que rouba,
já ratonice
é roubo insignificante.
Na gíria, rifar é bifar. Rouba é o mesmo
que roubo e roubador o que furta e, como
há tantos modos
de roubar, defendamo-nos da roubalheira quotidiana a que estamos sujeitos.
Sacomão termo em desuso que
designava o salteador e saco o acto
de saquear. Saca, é um elemento de composição que
traduz a ideia de sacar
ou tirar,
daí sacar significar também tirar a alguém, em benefício próprio e contra sua vontade. A malandragem
usa safar para
designar os seus
furtos, e os modernos
dicionários já
incluem o termo. Saltada é roubo com
assalto e salto roubo
em estrada,
pilhagem ou
saque. Quando
se diz que o país
está a saque, todos
compreendem, apercebem-se dos que estão
a saquear
e, por vezes,
até conhecem o saqueador. Senhorear-se ou
assenhorear-se é tornar-se,
ilegitimamente, senhor de. E sonegar é deixar
de mencionar, com
fraude, acto corrente para suas excelências que,
embolsando milhões, apresentam prejuízos. Ao sovacar,
o sovaqueiro pira-se com o roubo debaixo do sovaco, sendo
denominado também ladrão de fazendas.
Um pobre
diabo! Ao subtrair, furta-se alguém
de forma escondida ou
fraudulenta, termo
muito próximo
do surripiar
ou surripilhar,
com um
leque alargado, que
vai da surripiação ao surripiado ou
surripilhado, surripianço e ainda o respectivo surripiador
que comete o surripio, acto ou efeito de furtar. Tirar é desvio ou roubo, depende da classe e do montante, e tomar é apoderar-se de bens
alheios. Trabalho e trancanhir é, em
calão, roubo,
assalto, mas
trancanhir tem pinta!
Trapaçar ou
trapacear
é enganar, fazer contrato fraudulento, burla
ou embuste;
trapacice acto do que fez a trapaça.
Unhar é muito usado
na “Arte de Furtar” do Padre Manuel da Rocha.
Quanto a usurpação, por meio de violência
ou artifício,
tem como artífice
o usurpador,
que mais
não faz que
usurpar,
ao adquirir fraudulentamente
ou apossando-se violentamente
do alheio. O vigarista burla ou engana os
ingénuos ou incautos
e que, ao vigarizar, faz vigarice.
Na
letra xis
só encontrei o local
onde se encontram os pequenos trapaceiros
que vão
de cana
para o xadrez, xilim
ou xilindró.
1 comentário:
Um trabalho exaustivo,sem dúvida!Fiquei a saber que respeito mais um ratoneiro que um manata.Que uns,dão origem aos outros,como é o caso!Abraço
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